O
autor de um texto que li posiciona-se contra a pornografia e a
prostituição. Segundo ele, tanto uma, como outra, são componentes
de uma indústria do sexo que "coisifica o corpo da mulher".
Não
pretendo fazer apologia da coisificação do ser humano, em qualquer
de seus aspectos, mas entendi que a crítica se estendia para além
disso, para qualquer tipo de prostituição ou qualquer tipo de
pornografia. Desse transbordamento, discordo.
Isso
porque a prostituição sempre existiu e, pelo visto, sempre
existirá, ainda que seja exterminada a tal "indústria do
sexo". Isso porque sempre existirão pessoas que, sem outra
alternativa, exercerão a prostituição como fonte de subsistência.
E, num ambiente utópico desprovido de miséria e pobreza, sempre
existirão os que pratiquem a prostituição simplesmente por gostar
da atividade (e por que não?).
Quanto
à pornografia, entendida como a iconografia do sexo, tampouco
deixará de existir, inclusive porque parcela dela é importante
componente da arte.
A
maioria das prostitutas presta seus valorosos serviços às classes
pobre e média. Nem poderia ser diferente ou elas morreriam de fome,
já que o percentual de ricos em relação à população total é,
de fato, quase insignificante. Na Índia, por exemplo, as
prostitutas, em geral paupérrimas, trabalham por um ou dois dólares
por sessão de sexo. Duvido que seus clientes sejam banqueiros.
Estudos
indicam que parcela substancial de pessoas que se prostituem gostam
da profissão e não a largariam nem mesmo se tivessem alguma opção
para ganhar a mesma coisa.
Há
um quê de arrogância na análise que se faz dos outros a partir dos
próprios valores. E daí se alguém quer se prostituir? Desde que
seja uma decisão livre, sem coação, o problema é de quem escolhe.
Pode-se alegar que essa é uma liberdade falsa, premida pelas
necessidades da vida. A questão é que necessidades da vida são
parte importante da própria vida e constituem um importante elemento
de sopesamento de nossas decisões como todos os demais.
Não
se pode imaginar que a liberdade verdadeira estaria no ato de se
abster da prostituição e morrer de fome. Muito estóico mas pouco
prático.
Em
relação à coisificação do corpo da mulher, constitui um fato
humano e imorredouro. Desde as pinturas rupestres que o ser humano
(em geral do gênero masculino) gosta de imortalizar o corpo da
mulher, cada um segundo a sua época. Essa pictografia acaba por
destacar a conformação plástica tida por ideal naquele momento
histórico, pressionando os demais elementos da sociedade a nele se
enquadrar.
Hoje
as mulheres querem ser magras, ontem já pretenderam possuir as
formas da supergordinha Vênus de Willendorf ou das "cheinhas"
das telas de Boticelli. Hoje gostamos de ser cheirosos, mas
Bonaparte, a uma semana de Paris, já enviou carta à Josefina
suplicando-lhe que não tomasse banho. Hoje as mulheres sofrem nas
cirurgias plásticas, ontem desmaiavam na pressão dos corpetes.
Enfim,
essa "coisificação", e não se está aqui justificando,
não é moderna. O ideal não é a supressão dessas idiossincrasias
civilizatórias. O ideal é que a sociedade humana possibilite, a
cada indivíduo, as condições necessárias para que possa
livremente escolher o que deseja ou não fazer de sua vida. Se optar
pela prostituição, a ninguém é dado o direito de crítica ou,
pior, de restrição.
Seja
pela ausência das carências financeiras que para elas o empurram,
seja pela existência de uma sólida formação educativo-cultural
que o torne capaz de criticamente avaliar se determinado
comportamento ou esterótipo, imposto pela mídia, deve ou não ser
reproduzido.
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