A
Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) condenou a
Editora Abril ao pagamento de R$ 500 mil por danos morais ao senador
e ex-presidente Fernando Collor. O motivo foi um artigo que ofendia o
ex-presidente, veiculado numa das revistas de maior circulação do
país, a Veja. Além da editora, foram condenados Roberto Civita,
presidente do conselho de administração e diretor editorial, e
André Petry, autor do artigo em que o ex-presidente foi tachado de
“corrupto desvairado”.
Alguns
poderão considerar que a Veja foi condenada por falar a verdade, ou
ainda que o STJ ofendeu a liberdade de imprensa. As coisas,
entretanto, não são tão simples como aparentam.
A
questão não se resume, como pode aparentar, à simples exposição
de uma opinião individual acerca de ser, ou não, o Collor um
“corrupto desvairado”.
A
questão muito mais relevante que se impõe colocar é: a liberdade
de imprensa implica possibilidade de, sem qualquer prova efetiva,
publicar juízo negativo de valor sobre o caráter ou a honestidade
das pessoas, físicas ou jurídicas?
O
que uma pessoa comum pensa sobre qualquer figura pública,
manifestando-se em rodas de papo furado, não possui qualquer
relevância para a honra dessa pessoa . Todavia, os reflexos não são
os mesmos se essa mesma opinião, esse juízo de valor, é repassada
para milhares ou milhões de pessoas através da imprensa, caso em
que, instantaneamente, a opinião é alçada à condição de verdade
pelos leitores, muitos deles com espírito crítico rarefeito.
Há
outra questão, ainda, que se encontra subjacente a essa: não é
possível ao comum do povo ter acesso à verdade daquilo que é
noticiado. Simplesmente não se tem acesso a isso. O que se passa
entre os deuses do Olimpo, nos altos escalões civis ou políticos da
sociedade, constituem mistérios insondáveis para os reles mortais.
Resta, assim, atribuir algum crédito àquilo que é publicado, única
forma de se imbuir da sensação, sempre falsa, de que se é bem
informado. Nunca vai além disso: da mera sensação de estar bem
informado.
A
verdade real, a informação exata, o que exatamente aconteceu, essa
jamais estará acessível. Jamais se saberá, por exemplo, o que
efetivamente conduziu alguém, ou um grupo, a projetar aviões contra
as torres do WTC (será que foi mesmo um grupo de terroristas
muçulmanos; terão sido árabes; ou quem sabe um caso de
auto-terrorismo, coisa dos próprios capitalistas americanos?),
Grande
parte das pessoas pode ter desenvolvido a opinião de que o Collor,
de fato, envolveu-se em corrupção durante seu governo. Em se
baseia, contudo, tal convicção? Certamente em absolutamente fato
algum do qual se tenha conhecimento concreto e palpável. Baseia-se
exclusivamente em reportagens lidas, vistas ou ouvidas, produzidas
pela mesma imprensa que causa desconforto e desconfiança quanto a
própria honestidade.
Há
possibilidade de Collor ter sido vítima de uma grande, maliciosa e
secreta artimanha política e que seja inocente? Claro que é
possível, ainda que improvável.
A
impossibilidade de acesso à informação verdadeira, que atinge
indiscriminadamente a população, mesmo os que se consideram bem
informados, gera a correspondente necessidade de dar cuidado ao que
se fala, às opiniões desenvolvidas.
A
verbalização de opiniões negativas sobre pessoas exige um
fundamento apropriado. O grau desse cuidado será tanto mais elevado,
quanto maior for a capacidade de quem fala de causar repercussão.
Nessa perspectiva, a imprensa não pode ser equiparada ao indivíduo
no que concerne às manifestações que produz. A repercussão que
sua opinião alcança é incomparavelmente maior.
Collor
foi absolvido pela justiça das acusações de corrupção em decisão
tomada após o desenvolvimento de um processo no qual provas foram
produzidas. A partir dessa declaração judicial, à imprensa não
cabe publicar que ele é um corrupto desvairado, a não ser que essa
opinião seja fundada em provas coletadas na investigação
jornalística e exibidas na própria reportagem, de preferência.
Mesmo nesse caso, moderação seria mais adequada e inteligente.
A
revista poderia afirmar possuir provas de que o Collor esteve
envolvido diretamente na prática de corrupção, o que constitui uma
informação e é mais elegante do que afirmar ser ele “corrupto
desvairado”.
A
revista errou e vai pagar. Caso encerrado
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