Afinal,
qual o elemento de dominância em nossas ações, os hábitos da
cultura ou os instintos da evolução?
Trata-se
de questionamento para o qual não há unanimidade entre os
pensadores simplesmente porque é praticamente impossível aferir a
real motivação subjacente a cada ação humana.
Em
termos meramente evolutivos, e considerando a origem comum de todos
os animais e a consequente evolução comum dos instintos,
dificilmente alguns milhares de anos de cultura se imporão
profundamente sobre cerca de um bilhão de anos de reações
instintuais.
Como
exemplo, a sede de lucro que impulsiona o capitalista moderno nada
mais representa, sob uma nova roupagem cultural, do que a realização
do instinto animal de comer o máximo possível da caça abatida
hoje, pelo receio da fome de amanhã, se possível com acumulação
de parte da caça, em algum lugar escondido, para o imprevisível
futuro.
Num
outro exemplo, tem-se que a vontade sexual de trair, que acomete em
algum momento grande parcela dos seres humanos, ainda que muitos
resistam ao impulso, certamente decorre do instinto natural de
disseminação genética. A infidelidade, nesse sentido, é mais
natural do que a fidelidade monogâmica, inclusive porque a
variabilidade genética é mais saudável para as espécies do que a
endogamia.
São
vários os indicadores de que as ações humanas se pautam mais em
função de suas reações instintuais do que pelos modelos culturais
adquiridos. Basta uma passeada de carro no trânsito das grandes
cidades para verificar. A agressividade animal permeia cada avenida
engarrafada, cada estacionamento lotado, cada fila comprida, cada
mercado entupido.
O
que leva um doutor a sair no tapa porque levou uma "fechada"
no trânsito? Culturalmente ele é sabedor das regas da civilidade,
da urbanidade, do império da legalidade e do monopólio da justiça
pelo Estado. Ainda assim, apesar de adestrado e doutrinado durante
toda a vida, ele é compelido a dar uns sopapos naquele que, segundo
sua ótica, é um mau motorista e atrapalhou a sua vida por alguns
minutos. Nada há de racional ou lógico nisso. Trata-se de seu
animal interior gritando e assumindo o controle, determinando que
contorça a face e arreganhe os dentes para o perigo.
Não
se trata de apologia ao uso irrestrito dos instintos em desfavor dos
hábitos culturais, mas de evidenciar que, ao menos por enquanto,
ainda somos animais quase irracionais andando sobre duas patas e
quatro rodas e pensando ser capaz de dominar os instintos.
Lemos
Kant, é verdade, mas ainda uivamos para a lua.
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