O
escritor português José Luís Peixoto é autor de um pequeno texto
chamado “O amor burguês”. Muito bonito, o texto fala sobre a
ausência de poemas que descrevam o dia a dia do amor, como, por
exemplo, um casal fazendo compras no supermercado. Segundo o autor,
“é muito fácil confundir o banal com o precioso quando surgem
simultâneos e quase sobrepostos”.
Perfeito.
De
fato, ás vezes não percebemos como algo comum pode ser muito mais
importante que qualquer coisa rara. Vou dar um exemplo radical: o ar
que respiramos. Nada é mais importante e, ainda assim, mal nos damos
conta de sua existência.
Em
relação ao amor, poemas realmente não falam, em geral, sobre o
banal do amor, que é a comunhão na rotina, embora seja, essa
comunhão, a maior parte da relação amorosa.
Poesias
costumam falar sobre as dores dos amores desprezados ou tecer loas
aos sonhos aprazíveis passados com a pessoa amada em cenários
paradisíacos, que raramente são materializados. Poetas nada
enxergam de especial na experiência conjunta do dia-a-dia,
justamente talvez por ser tão comum.
Isso
se deve, provavelmente, à necessidade que o ser humano sensível
possui, em contraponto à rotina sedentária, de um retorno, ainda
que ilusório, à sua real natureza, inquieta e sempre em busca da
concretização de sonhos, sempre perseguindo ilusões.
Em
suas mentes, seres humanos românticos se veem como cavaleiros
errantes salvando a donzela na torre, ainda que estejam sentados no
confortável sofá da sala. Humanos não apreciam muito a realidade
crua do concreto, do real, prefere revesti-la com as flores do
intangível.
Não
se verão poesias, e, por favor, nem delas faço aqui apologia,
descrevendo a alegria que o poeta apaixonado sente ao ver o grande
amor de sua vida sentado no assento sanitário, feliz ao fazer suas
necessidades fisiológicas, com os sons e aromas inerentes ao ato,
assim demonstrando sua boa saúde. Isso é cru demais para a
sensibilidade do ser humano.
Porém,
no fundo, no fundo, é isso que desejamos para e de quem amamos:
saúde, felicidade, companheirismo duradouro e solidariedade nas
aflições.
Poesias
são oníricas, o amor é mais que isso.
Poesia
contém apenas palavras; será o amor, envolvendo pessoas, que lhe
transferirá a emoção do poeta.
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