Não há dúvida de que, em qualquer setor do conhecimento e da práxis humana, a polifonia sempre será saudável. Isso se aplica também, principalmente e não poderia ser diferente, à política, pois a existência de visões múltiplas sobre a melhor maneira de organizar a sociedade permite que a escolha recaia sobre aquela que se revele mais adequada.
Como
diz o velho e sábio ditado, várias cabeças pensam melhor do que
uma.
Esse
processo, claro, envolve a discordância dos defensores do projeto
perdedor. Tal oposição é normal e aceitável na democracia, desde
que não extrapole o âmbito da razão e não ser arvore na pretensão
de derrubar, por vias oblíquas, o que democraticamente foi decidido.
A racionalidade é o caminho, sempre.
Um
amigo, porém, lúcido, polido e racional, preocupado com a tensão
política que estamos testemunhando, discorda do uso da palavra
"coxinha" para referir-se aos antipetistas, por entender
que a oposição possui o direito de manifestar-se e que as portas
devem manter-se abertas para o diálogo, único meio racional de
convencimento.
Como
discordar desse argumento? Num primeiro momento, não há como.
Prossegue
ele, afirmando que a oposição antipetista brasileira não pode ser
comparada aos nazistas, pois, afinal, estes faziam abajur com pele
humana. Argumenta ele que, mantido esse enfrentamento mais acirrado,
a coisa tende a piorar e, que para evitar isso, devemos nos manter
dispostos a enxergar a racionalidade do outro, que deve ser tratado
como um interlocutor legítimo, apesar de tudo.
O
argumento é perfeitamente válido. Porém, cabe lembrar que, no
início, os nazistas não faziam abajur com pele humana. Isso, e
coisas muito piores, veio a ocorrer bem mais tarde, de forma gradual,
encorajados que foram pela leniência inicial dos alemães. Muitos
alemães, na verdade, somente descobriram o horror nazista no final
da guerra. A covardia moral dos alemães foi cúmplice do Holocausto.
O
registro histórico, assim, nos ensina que não basta uma minoria do
mal invocar o mal para que o mal se materialize. O sucesso e o
esplendor do mal envolve a ingenuidade, a passividade, a leniência,
a pusilanimidade da maioria que é do bem.
Quem
não aprende com o passado está fadado a repetir a tragédia, ainda
que sob o manto de farsa, como pontificou Marx.
Hoje,
os antipetistas irracionais gritam contra nordestinos, não aceitam
resultados democráticos de eleições e propõem a extinção do
voto de quem recebe benefício do governo. Hoje são acumpliciados
pelo discurso raivoso e obscurantista de Felicianos, Malafaias, Bolsonaros e
Lobões, que estrilam contra os direitos humanos, contra gays e
outras minorias e também contra os avanços da ciência.
Que
sinal mais claro de fascismo poderia ser dado além desses?
Em
que momento é rompido o limite entre o legítimo direito de
manifestação política e o início de um projeto totalitário
fascista? E, chegado esse limite, qual o papel a ser exercido pelo
cidadão de bem contra esse projeto?
Acredito
que a denúncia escancarada do mal integra o papel do cidadão.
Talvez
se possa evitar o uso da palavra "coxinha", trocado por
"antipetista", mas isso, em si, não é relevante, assim
como não seria no início da ascensão do nazismo designar os
nazistas pelo adjetivo que mereciam: "facínoras".
Acreditem:
“coxinhas” não estão nem aí para o fato de serem chamados de
“coxinhas”. Para eles não é o adjetivo que interessa, mas o
sucesso do projeto antipetista. Alguns demonstram certo orgulho de
ser “coxinha”.
Aliás,
os antipetistas não possuem pudor algum no uso de adjetivações
pejorativas, como "petralha", “esquerdopata”,
“comunista” e por aí vai. De vez em quando, sugerem o exílio de
petistas em Cuba. Vamos combinar que, diante disso, chamar alguém de “coxinha” é
até carinhoso.
A
questão real, fatídica, inescapável, é que acabou a
tranquilidade, o marasmo mesmo, que envolvia a política brasileira
desde o fim do Golpe Militar. A partir de agora, compete a cada
cidadão defender o modelo de sociedade que deseja para o
país.
Para
os opositores mais relevantes do PT, esse modelo vem embalado no
pacote neo-liberal.
Para
os petistas, o projeto neoliberal não conduz a sociedade a
realização da justiça social e do florescimento humano.
Essa
divergência está circunscrita ao âmbito da convicção política
pessoal, o que pode ser enfrentado pela via da dialética racional.
Contudo,
os antipetistas que são designados de “coxinhas” possuem um
único projeto: tirar o PT do poder a qualquer custo, mesmo se isso
exigir a ruptura institucional, seja através da colocação de um
fascista de direita no poder, seja com o sonho do retorno à ditadura
militar, no fundo duas cabeças da mesma serpente. Para alcançar esse objetivo, adotam
a retórica do sofisma, da fraude, da mentira, utilizam um tom falso
de indignação para “denunciar” no PT as mazelas que
historicamente sempre permearam as relações políticas. Na cabeça
dos “coxinhas”, o problema não são essas mazelas. Não são
elas que devem ser combatidas através de uma reforma política. Todo
os problemas brasileiros atendem pelo nome de PT.
Essa
indignação é sempre seletiva: nenhum outro partido possui defeito.
O
mantra “coxinha” é de que tudo no Brasil piorou após a entrada
do PT no governo, que nenhuma melhora pode ser creditada à gestão
petista, mas sim ao quadro favorável internacional, e que, não
fosse o PT, seríamos hoje certamente a maior potência do planeta.
Por
incrível que pareça, muitos tolos têm embarcado nesse discurso “non
sense”.
O
neoliberalismo desejado pelos tucanos, ainda que dele se discorde, é
um projeto econômico-político legítimo, que pode ser colocado na
pauta de discussões públicas como uma opção de futuro. É ruim e
deseja-se que sucumba na urnas, mas é um direito de seus defensores
que seja colocado em questão.
O
projeto petista, mais vocacionado à gestão da questão social e ambiental, é igualmente legítimo.
O
que não possui legitimidade é o discurso moralista seletivo e
desagregador do anti-petismo fundamentalista.
Oposição
real é bem-vinda e sempre será, o antipetismo fundamentalista,
porém, não pode ser definido como oposição. Trata-se de
manifestação da plutocracia enraivecida, que não aceita qualquer
concessão às classes menos favorecidas.
Nesse
sentido, os "coxinhas” devem ser repudiados de forma pública
e, de preferência, ridicularizados. O “coxismo” deve ser
expurgado de nossa realidade política porque não representa um
posicionamento político compatível com o nível civilizatório da
humanidade, que exige a prevalência da dignidade da pessoa humana.
O
“coxismo”, como vertente política, constitui um sinal claro do
início do mal.
Suas
manifestações não deveriam, como são, admiradas e repercutidas
pela mídia, pois isso os torna um exemplo a seguir, produzindo
efeito multiplicador sobre a malignidade.
É
essa repercussão midiática que justifica e confere todo sentido ao
repúdio massivo da parcela sensata da população brasileira, que
deve contragolpear essa repercussão através da rede.
Está
em nossas mãos evitar a ascensão do mal.
Que
fique a oposição sensata, que busca o bem do Brasil, mesmo que dela
se discorde.
Os
coxinhas, entendidos como fundamentalistas radicais, precisam ser
estimulados a voltar ao buraco escuro e silencioso de onde surgiram.
como pode alguém escrever tantas linhas sem dizer nada...
ResponderExcluir