domingo, 15 de março de 2015

O ordinário se presume


Uma pessoa me acusa de ser paranoico e inventor de teorias da conspiração, por conta da advertência que fiz da possibilidade de uso, por parte da oposição ao governo, da tática de bandeira falsa, ou seja, colocação de pessoas travestidas de petistas para provocar desordem nas passeatas de hoje, 15/03.
De fato, pode existir paranoia do meu lado, se esse for um novo nome para cautela (se informem sobre os sequestradores do empresário Abílio Diniz e as camisas do PT que usavam). Afinal, já diz o ditado de sabedoria popular que gato escaldado tem medo de água fria.
Há, contudo, mais, muito mais, ingenuidade do outro lado, pessoas para quem recomendo que busquem informações na rede sobre como atuam, na geopolítica mundial, os chamados "assassinos econômicos".
Os inocentes pensam que estão marchando pelo próprio bem, sem perceber que, de fato, estão defendendo o interesse de quem os oprime.
A marcha do dia 13, a favor do governo, não foi, como acusam, promovida pela "classe média borradinha de medo de perder as benesses do governo".
Pelo contrário, a de hoje, dia 15, contra o governo, é que é, em grande parcela, constituída pela classe média borradinha de medo de perder a sua empregada doméstica em função da valorização de sua dignidade. E teme, além disso, ter que compartilhar o avião com ela. As pessoas gostam de exibir a diferença como símbolo de sua parcela de poder no microcosmo em que vivem.
A classe média é singular porque representa, simultaneamente, os papeis de oprimido e de opressor. Não se defende contra quem a oprime porque assim consegue manter o seu micropoder opressivo contra empregadas, porteiros e garis.
A parcela da classe média que assim age, torna-se inconscientemente massa de manobra da verdadeira elite (porque classe média não é elite, ao contrário do que ela delira acerca de si mesma), aquela que de fato tem efetivo domínio sobre o capital que atualmente não possui pátria.
E a real elite está doida para quebrar a Petrobras e pôr as mãos em seu petróleo. Doida para quebrar as empreiteiras e assumir as obras de infraestrutura. Doida para quebrar os estaleiros e obrigar à construção de navios no estrangeiro. O que querem, em suma, é abrir as portas do país para as grandes empresas internacionais (principalmente americanas).
A engenharia ficou estagnada por quase trinta anos. Depois, foi ao paraíso, pois nunca se viu tanta obra nesse país. Isso não impede, entretanto, que diversos engenheiros estejam hoje nessas passeatas. O mesmo ocorre com diversas outras profissões. Advogados trabalhistas bem sucedidos não vêem relação alguma entre a montanha de dinheiro que ganharam na última década e a criação de cerca de vinte milhões de empregos durante o governo petista, o que, logicamente, pressionou a Justiça do Trabalho e literalmente lançou no colo dos causídicos milhões de novas ações trabalhistas. Para muitos deles, o mérito é pessoal, decorrente de terem "ido à luta".
Vá entender. Só pode ser uma mistura de ignorância, de alguns, e de má-fé, de outros. Alguns são duais, carregando em si os dois "valores".
Essa ação da verdadeira elite, de atuação na política de outros países que incomodam o capital, é absolutamente comum e é materializada de diversos modos diferentes. Fizeram isso no Iraque, embora sob estratégia bem diferente, mais direta. Não dá para entrar no Brasil (pelo menos ainda não) com os drones militares, então utilizam um processo subterrâneo: financiam a desestabilização política de quem os incomoda.
A Operação Lava Jato é uma iniciativa correta em sua origem. Nada mais fez do que pôr a descoberto um esquema de corrupção que provavelmente vem desde Cabral (o Pedro, não o Sérgio). Ou alguém acha que as empreiteiras não se juntaram em cartel para superfaturar a Construção de Brasilía? Ou a Transamazônica? Ou a Hidrelétrica de Itaipu? Ou alguém acha que as privatizações foram realizadas de forma absolutamente lisa? Só ser for um completo idiota.
A diferença é que nenhum governo anterior permitiu a livre investigação dessa mazela. Os militares matavam ou torturavam os denunciantes, o que teve um efeito, digamos, redutor de denúncias. FHC escondeu tudo o que pôde através de seu Engavetador Geral da República.
É claro, porém, que os ingênuos acreditam na total honradez de todo e qualquer político que não seja do PT. Tal ingenuidade já deu margem a ser dito que nesse país, para não ser preso, basta ser menor de idade ou filiado ao PSDB.
Contudo, embora correta no papel institucional de combater a corrupção, a Lava-Jato padece de equívocos em relação aos procedimentos que estão sendo tomados em relação à Petrobras e às empreiteiras, a começar pela publicidade seletiva de trechos do inquérito e da ação penal, o que surte efeitos no mercado de ações.
Ademais, se por um lado temos o superfaturamento das obras sendo investigado, de outro temos o "superfaturamento" do valor da corrupção. Já chegaram ao extremo de afirmar que os corruptos embolsaram cerca de 90 bilhões de dólares, um total delírio.
Em virtude desses equívocos, obras foram paralisadas e quase duzentos mil brasileiros já perderam o emprego, afetando suas famílias.
Quando os EUA foram ludibriados pelos banqueiros, que usaram e abusaram de procedimentos sem ética no mercado financeiro, tudo em nome de ganhar mais dinheiro, o procedimento foi de investigação dos ilícitos e, na medida do possível, prisão dos financistas culpados pelos desvios. Entretanto, o governo não hesitou em injetar cerca de um trilhão de dólares nos bancos, para que não quebrassem. FHC fez o mesmo no Proer.
A lógica é simples: não se pode quebrar a espinha dorsal da economia, sob pena de efeito dominó no restante.
A construção civil é um desses pilares. Quebrar as principais empresas brasileiras a troco de combater a corrupção passa de ingenuidade: é burrice. Não há dúvida de que os empresários e políticos corruptos devem ser postos na cadeia. As empresas, contudo, devem ser salvas de alguma forma, pois estão na base da economia e são importantes para todos nós.
Não será bom para o país que nossas grandes obras sejam internacionalizadas, que mais empresas estrangeiras tomem conta de uma economia que já é quase totalmente dominada, em seu aspecto macro, pelo capital estrangeiro, como as telecomunicações, a energia e mesmo o sistema bancário.
Algum pensador já enfatizou que pessoas sábias discutem ideias, pessoas inteligentes discutem fatos e pessoas comuns discutem pessoas.
Os brasileiros que gritam nas ruas contra o PT fulanizam a discussão, discutem pessoas, e partem da premissa completamente equivocada de que a retirada do PT do governo, por si, é capaz de salvar o país e livrá-lo da corrupção.
Não salvará e não livrará.
Pelo contrário, ladrões piores, como os que a história nos fornece múltiplos exemplos dos que já tivemos, formados para o crime em instituições eficientes como Harvard, estão sedentos, salivando e arranhando o chão na ânsia de retornar ao poder. Se isso ocorrer, não tenham dúvidas de que serão extremamente reduzidas as notícias de corrupção nos jornais e outros meios de comunicação. Voltaremos à falsa paz que antes existia enquanto, escondidos, os ratos roíam nossas riquezas.
Repito: seria melhor para o país que, juntos, petistas e antipetistas, exigissem nas ruas o fim do financiamento privado de campanhas, o principal câncer desse país e o principal entrave à concretização da democracia. E também o fim da propriedade cruzada de meios de comunicação, porque, do jeito que o sistema funciona hoje, as empresas de comunicação, como a Globo e a Abril, decidem qual será a pauta de discussões públicas. Basta colocar o assunto na capa da Veja e repercuti-lo no Jornal Nacional.
Se decidirem que será um assunto sério, como fortes evidências de corrupção de um político, assim será. Da mesma forma, podem decidir, como comumente fazem, que será um assunto para distrair o povo, como o preço do quilo do tomate, sem esclarecer que é sazonal.
O perigo para os que não integram a elite, é quando essas empresas, cientes de seu quase monopólio na divulgação da informação, decidem, "chateaubrianamente", "marinhamente" ou "friasmente", simplesmente inventar algo contra quem as está incomodando, procedimento comum na imprensa brasileira e não é de hoje.
Decidam o que decidirem, de modo honesto ou desonesto, todos estarão, no dia seguinte, comentando a denúncia da Veja, repercutida na Folha, no Estadão e no Jornal Nacional, sem que se possa realizar o contraponto de uma rádio ou de um jornal independentes, que hoje não existem.
Pode parecer teoria conspiracionista, mas se trata apenas de analisar o registro histórico e compará-lo com os atos do presente.
E o que a história nos conta é que a imprensa já defendeu golpes, já defendeu o capital estrangeiro contra o nacional, já colocou camisas do PT em sequestradores, já divulgou notícias falsas contra aqueles que considera inimigos e já afirmou, com todas as letras, através da presidente de sua associação (Judith qualquer coisa) que se coloca como oposição política ao governo do PT.
Não há razão alguma para supor que não agirá novamente como sempre agiu. Há um brocardo jurídico que diz " o ordinário se presume". Estou de acordo.

No fim, como já disse e não temo repetir, meu intuito é, por pequeno que seja, fazer o meu papel para evitar que, como farsa, se repita a tragédia.

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