Afastadas
as necessidades básicas de absorção de nutrientes e busca por
abrigo, o primeiro, grande e principal problema existencial da
humanidade, como desejo inconfesso e objeto de autocontenção
repressora e produtora de neuroses, é o sexo.
O
segundo, que decorre em grande parte do primeiro, é o poder. Quem
tem poder, amplia sua possibilidade de se relacionar sexualmente.
O
terceiro, que é produto dos dois primeiros, é o dinheiro. Sigam o
dinheiro! É ele que compra o poder que por sua vez conduz ao sexo.
Esses
três desejos, juntos, certamente respondem pela imensa maioria dos
crimes cometidos e, possivelmente, arrisca-se a dizer, indiretamente
por todos.
O
processo repressor desses desejos forma uma eficaz linha de montagem,
em escala industrial, de seres humanos desajustados, neuróticos e em
constante conflito em relação ao que, erroneamente, aprenderam a
entender como vício, como imoralidade, como pecado. Por quê?
A
razão é localizada na circunstância de que a sociedade humana
sacralizou o sexo de forma desmesurada e disso resultou que o
indivíduo, não alcançando obter a contenção sexual irreal
perseguida pela sociedade, e ao mesmo tempo constatando que a
realidade demonstra que os poderosos são mais livres em relação ao
sexo, passou a nutrir um intenso desejo pelo dinheiro e,
consequentemente, pelo poder, ambos como símbolos do próprio valor
individual e atratividade sexual, únicos meios de entregar-se à
luxúria pecaminosa. Daí as frustrações neurotizantes, pois todos
são desejos de difícil obtenção.
Entretanto,
por mais que se tente afastar esse cálice de seus lábios sedentos,
o fato é que seres humanos gostam de sexo. Na verdade, gostam muito
e querem praticá-lo com muitas pessoas, em todos os lugares, em
todas as posições e sempre que possível. O que os impede são as
restrições impostas pelas grades morais da sociedade.
Especificamente
em relação ao comportamento sexual, o ser humano, enquanto primata,
certamente está mais próximo da sociedade dos simpáticos bonobos
do que para os irascíveis chimpanzés e gorilas. Bonobos fazem sexo
por prazer e como forma de socialização. Ninguém é de ninguém
entre os bonobos.
Pelo
que se observa na sociedade humana, essa parece ser também a sua
natureza, que, todavia, é devidamente repudiada, com todas as
consequências neuróticas que daí advêm, testemunhadas nos divãs
psicanalíticos, nos balcões das drogarias, nos suicídios e nos
diversos tipos de comportamentos considerados como socialmente
desviantes.
Criou-se
a imagem abjeta de que gostar de fazer sexo com várias pessoas
representa promiscuidade. Isso não é verdade, trata-se de
inclinação instintual e possui intensidade diferente entre as
pessoas. Há quem goste muito, há quem não goste nem um pouco. A
questão, contudo, cabe à esfera íntima de cada um, não cabendo a
alguém imiscuir-se na atividade sexual do outro.
Não
se pode conceber o sexo como pecado, de forma nenhuma. Sexo é
natural, possui o poder de aproximar, de fabricar intimidades, de
gerar afetos.
Seres
complexos que são os seres humanos, porém, criaram-se variados
tabus em relação ao ato sexual, no mais das vezes impulsionados
pela histórica insegurança masculina e seu interesse na manutenção
da propriedade (dinheiro e poder). Trata-se de uma modalidade de
insegurança machista que poderia ser adequadamente denominada de
síndrome do Cuco, pássaro que coloca seus ovos em ninhos alheios,
para que outro tenha o trabalho de chocá-lo e criar o filhote. O
filhote de Cuco, assim que sai do ovo, joga fora os ovos do
hospedeiro para receber atenção exclusiva dos pais adotivos que nem
sabem que são adotivos. Essa possibilidade aterroriza os homens
desesperadamente.
Sem
o tabu sexual, como se poderia ter certeza que o filho é daquele
específico homem? Como saber se a propriedade está sendo
transmitida por herança ao filho biológico e não ao filhote de
Cuco?
São
inquietações que deram origem a instituições como a monogamia, a
fidelidade sexual e outras restrições mais perversas, que já
chegaram a incluir cintos de castidade e direito do marido sobre a
vida da esposa.
Ao
lado disso, e com não menos importância, existia no passado o medo
das doenças venéreas, que igualmente recomendava um comportamento
sexual mais conservador e menos promíscuo.
Todo
esse caldo cultural histórico de medos, inseguranças e doenças
tornou o sexo um ato pensado, ainda que de modo subconsciente, como
sujo e impublicável. Logo o sexo, que representa nada mais, nada
menos, do que a perpetuação da vida.
Em
geral, no modo natural, as vidas são iniciadas no percurso de uma
vagina e é esse órgão que se torna o objeto da maior das
pudicícias humanas, a mais recôndita das partes das pessoas, a mais
indizível, a que menos se pode ver ou mesmo dizer, a que menos pode
gozar.
Numa
sociedade patriarcal, o pênis não se vê envolvido por carga de
tamanho mistério e sacralidade. Ao pequeno menino é permitido sacar
seu órgão genital de dentro do calção e, sem grandes pudores, urinar na frente de
todos, que se rirão da sapequice. Faça uma menininha o mesmo e será
admoestada por exibir sua vagina.
No
entanto, sexo é vida! Não somente em função da reprodução, como
pelo bem estar físico e psicológico proporcionado a quem o pratica
de forma saudável e consentida.
É
possível fazer sexo uma vida inteira com uma só pessoa e ser feliz?
Sim, é perfeitamente possível e é ótimo. Por outro lado, é
possível fazer sexo com várias pessoas ao longo da vida e ser
feliz? Sim, isso igualmente é possível e pode se revelar ótimo
também para quem optar por esse caminho.
Não
existem receitas ou fórmulas mágicas sobre a mais adequada conduta
sexual. A cada um compete escolher um modo próprio de orientar sua
vida sexual que o faça feliz.
O
que não cabe é violentar a própria natureza. Como diz o ditado,
não existe almoço grátis. Tudo tem seu preço. E o preço da
repressão é a neurose, com todos os malefícios que daí decorre
sobre o desenvolvimento da vida.
Faça
amor!
Se
não quiser fazer, tudo bem, busque a ascese, seja casto, mas não
imagine que possui o direito de criticar quem faz e a maneira que
faz.
Não
faça a guerra.
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