Michel Temer enviou “carta confidencial” à presidenta Dilma pretensamente para esclarecer como se comportará em relação ao pedido de impeachment. Após várias linhas de lamúrias infantis e ralas, ele informa, em uma singela frase, o que fará: permanecerá em silêncio obsequioso, com o objetivo de alcançar unidade partidária dentro do PMDB.
Em
outras palavras: “Sra. Presidenta Dilma, participarei do golpe e
tentarei tomar o poder”.
A
carta é histórica. Pela primeira vez uma pessoa pública de
importância significativa no cenário político brasileiro tem a
coragem de expor publicamente as próprias entranhas fisiológicas ao
povo.
Michel
Temer, completamente despreocupado com a explicitação de seu
caráter, relata à Dilma uma série de frustrações vaidosas e
ególatras
advindas da pouca importância que Dilma teria concedido ao valor político que ele julga ter. Afirma, de si próprio, ter sido uma importante peça política deixado num canto esquecido do armário de opções da presidenta. Reclama, sem cerimônia, sem qualquer pudor litúrgico, de indicações políticas fisiológicas suas que, ou não foram acolhidas por Dilma, ou saíram do governo após a reforma ministerial.
advindas da pouca importância que Dilma teria concedido ao valor político que ele julga ter. Afirma, de si próprio, ter sido uma importante peça política deixado num canto esquecido do armário de opções da presidenta. Reclama, sem cerimônia, sem qualquer pudor litúrgico, de indicações políticas fisiológicas suas que, ou não foram acolhidas por Dilma, ou saíram do governo após a reforma ministerial.
É
importante lembrar que uma das filhas de Temer é secretária no
governo Haddad.
A
carta é um esperneio birrento de criança mimada que viu negados,
pelos pais, alguns pedidos. E, como toda criança birrenta, a janela
da vingança ocorre quando os pais precisam que a criança se
comporte de determinada maneira, que faça algo. Nesse momento, a
criança, como mula, empaca, chora, se joga no chão e esperneia.
Curiosamente,
Temer julga-se uma peça-chave subutilizada na articulação política
e na condução da economia, queixando-se de que figuras menores,
como Picciani, foram chamadas em lugar dele para resolver conflitos.
Todavia, quando chega um momento importante de demonstrar essa
auto-alegada força política, prefere afirmar que se manterá
neutro, como convém a um presidente de partido que pretende unificar
os correligionários. Se a um presidente de partido é conveniente o
silêncio, de que forma no passado ele poderia ter sido útil em
temas delicados como a oposição aos desmandos de Cunha, que integra a facção, por assim dizer, rebelde de seu partido?
Todo
essa criancice inicial relatada na carta, no entanto, é somente para
justificar o subjacente: Temer, aos 75 anos de idade e que jamais
teve o necessário brilho político para tal, teve um vislumbre da
cadeira presidencial à sua frente e a quer, à todo custo, sendo
essa a única oportunidade que terá de alcançá-la. Pouco importa
se isso manchará a sua biografia, que nem possui tanta magnitude
assim, convenhamos. Pouco importa se enfrentará as massas nas ruas,
pois ele está testemunhando, com Dilma, que é possível governar
contramajoritariamente. Pouco importa passar por canalha para mais de
um terço dos eleitores e pela grande maioria dos juristas mais
sérios do país. Isso tudo passará, ele sabe.
O
que importa é que, nos livros de história, ele será lembrado com
um dos presidentes do Brasil. Isso é um elemento do futuro
importante para satisfação dos agigantados ego e vaidade, cuja presença em seu espírito a missiva golpista não deixa margem para dúvidas. O que
importa é que a caneta de nomeações passará para as suas mãos.
Isso é um elemento do presente importante para a satisfação da
ambição e da ganância, própria e partidária.
Se
essa exposição pública da motivação espúria que move grande
parte de nossos políticos é importante, se isso tinha que acontecer
um dia, ganha relevo maior que tenha ocorrido justamente com um
político que pertence ao PMDB, partido notoriamente conhecido como
um ajuntamento de políticos interessados em saquear o capital
público, com raras exceções. Partido de cuja pretensa depuração
viria a surgir um desmembramento intelectual, o PSDB, que todavia
rapidamente se curvou às imposições da genética partidária, inexoráveis, e
acabou por superar o partido-pai no que concerne ao pouco caso com o
público e com a coisa pública, mais atentos que estão seus
políticos aos próprios interesses. Quem sai aos seus, não
degenera. PMDB e PSDB são frutos da mesma espécie de política vil
que trava o desenvolvimento humano do Brasil. O PMDB ao menos tem a decência de não colocar "social democracia" em seu próprio nome.
A
carta de Temer explicita esse móvel, que até então algum pudor
ético ainda teimava em deixar na obscuridade, entrevisto apenas nos
contornos, nas sinuosidades das atitudes.
Estarão
juntos, sem dúvida alguma, no impeachment da Dilma.
É
ingenuidade supor que parte do PMDB se manterá fiel à Dilma. Se
ocorrer, será com pequena porção de seus integrantes. A maior
parte dos peemedebistas votará pela abertura do processo e, depois,
pela cassação, pois é da natureza do escorpião picar quem o está
salvando.
O
PMDB historicamente se aproveita dessas oportunidades. Foi assim com
Sarney, foi assim com Itamar e será assim com Temer. É um partido
ciente de que não conseguirá a presidência diretamente, em
eleições. Assim, não pode se dar ao luxo de perder oportunidades nas quais consiga concorrer à vice-presidência e, conseguindo-a, de trabalhar para defenestrar o
presidente eleito e se apropriar do poder. Não será dessa vez que
deixará a oportunidade passar.
Engana-se
quem pensa que o PMDB do Rio fechará com Dilma. No máximo, manterá
as aparências, o discurso falso de apoio, mas, a dimensão da chance real
presente já foi avaliada. Trabalharão por Temer. Os peemedebistas cariocas possuem a
mesma, talvez pior, natureza escorpiônica inerente ao partido. O Rio
de Janeiro é dominado pelo PMDB, com figuras como Picciani, Paulo
Melo, Sérgio Cabral, Moreira Franco e outros do mesmo naipe. É
preciso ser insano politicamente para dar um voto de confiança ao
PMDB do Rio.
Outro
ponto importante é quanto ao motivo do impeachment: após a
aprovação do processo, a motivação do processo não possui qualquer importância. O impeachment é um
julgamento político e não jurídico, os parlamentares não precisam
justificar ou fundamentar seus votos. Bastar votar “sim” ou "não" à
proposta de impeachment e basta que o “sim” seja maioria.
O
que poderia impedir o impeachment seria a demonstração inequívoca
de apoios importantes à manutenção do atual governo, seja do povo nas ruas, seja de
governos estrangeiros, seja dos formadores de opinião. Essa
contrariedade explícita ao golpe poderia impedir todo o processo. Isso não acontecerá.
O
povo irá para as ruas dividido. Para cada marcha de apoio ao
governo, haverá uma contra. A imprensa, agindo como sempre age, dará
mais relevância aos contrários ao governo, minimizará os de apoio.
Os
governos estrangeiros mais importantes não se mexerão. Na América do Sul, a argentina
acabou de mudar o governo para um mais conservador e que não se
arriscará a se comprometer negativamente com um futuro governo
igualmente conservador. Os Estados Unidos estão fechados com o golpe, estão na verdade por trás dele, e
reconhecerão o novo governo Temer no máximo duas horas após a cassação
de Dilma. Os demais governos, França, Alemanha e outros, manterão um silêncio obsequioso após a manifestação americana, lembrando que um possível governo Temer tenderá a ser percebido como mais
palatável aos interesses do mercado europeu, já que, desde o advento do
PT no governo federal, o Brasil buscou parcerias mais relevantes fora
do eixo EUA-Europa, tornando-se um incômodo.
Os
formadores de opinião, a nossa grande mídia, está fechada com o
impeachment e se manterá assim. Daqui a cinquenta anos, os grandes
jornais pedirão perdão aos leitores por mais essa adesão antidemocrática, considerarão que isso
encerra o assunto e pronto, acabou. A pequena mídia, por assim
dizer, ou seja, os blogueiros e a imprensa de tendência mais à
esquerda possuem capacidade de impactação menor. Terão influência
na produção de manifestações nas ruas, que todavia, como dito,
não serão repercutidas positivamente no Jornal Nacional.
Declarada
a cassação, ela não será revista pelo STF, que já demonstrou sua
inclinação anti-PT, capitaneada principalmente por Gilmar e seu
discípulo Toffoli.
O
povo irá para as ruas, será implacavelmente reprimido e, dois ou
três meses depois, todos estarão razoavelmente acostumados ao novo
presidente Temer, que passará a ser o reverso de Lula e de Dilma:
acariciado pela grande mídia e repudiado pela pequena mídia.
Poder
e política se divorciaram. Poder, como capacidade de realizar, e
política, como capacidade de definir o que realizar, não integram
mais o mesmo feixe de atribuições do Estado. O Poder de fato, hoje,
está nas mãos do mercado, como bem sabe e declara expressamente o ex-presidente FHC.
O
mercado, entendido como a institução que fornece a condição de o
dinheiro reproduzir-se a si próprio, disse não ao governo do PT desde lá
atrás, quando percebeu que os perdulários petistas gastariam
dinheiro, ainda que pouco, com os despossuídos. Isso sinalizava
a possibilidade de aumento orçamentário gradual da fatia do orçamento destinada ao social, aos poucos se
ampliando em direção ao máximo possível de bem-estar social, situação que os "mercadores" não desejam, não
existe nos EUA e já começaram a desmontar na Europa.
O mestre mercado quer o impeachment. Políticos do naipe dos que são
abrigados pelo PMDB e por seu filho, o PSDB, atenderão ao pedido do
mestre.
Michel
Temer é só uma peça dessa engrenagem e nem é a mais importante.
Está mais para capacho da cozinha do que para lustre de cristal do salão de bailes. Como
constitucionalista que se auto-percebe como importante, como suposto
pensador do direito, não deveria se furtar a explicitar opinião
contrária à vulgarização de um instituto sério como a cassação
do mandato de uma presidente da república eleita democraticamente. A fragilização do instituto, afinal, fragiliza a política e a democracia. Tampouco deveria ceder à vaidade de conseguir um mandato
presidencial furtivamente, à base do conluio, da traição e do
golpe institucional.
Isso,
porém, seria esperar muito de alguém com a herança de Adhemar de
Barros e com experiência de tantos anos num partido como o PMDB, onde a virtude não logra sobreviver por muito tempo. Não
esperem sentido ético ou seriedade política de Temer ou do PMDB. Eles não a possuem. Sua carta é a confissão do próprio despudor antiético.
As
perspectivas, como as percebo, são sombrias.
Amigo, recebo com muita amargura sua lúcida análise. Mas você não veria uma chance de reversão do processo, se os defensores da normnalidade constitucional radicalizassem em todas as frentes de batalha?
ResponderExcluirOi, Willians. Estou torcendo para estar errado. Sim, há chance de Dilma permanecer. Quem sabe um pouco de lucidez encontre a cabeça dos parlamentares? Abraços.
ExcluirEmbora concorde inteiramente com sua avaliação, torcerei e agirei para que você esteja totalmente enganado.
ResponderExcluirCom nosso engano, ganhará a democracia.