A
delação da JBS evidenciou a gritante diferença no modo de
aplicação do instituto da delação premiada entre a Lava Jato de
Brasília e a da República de Curitiba. Em Brasília, houve a
primazia da inteligência no curso da operação e do sigilo das
diligências. O vazamento, quando ocorreu, foi após a consumação
das principais diligências e não antes ou durante, como age Moro,
mais interessado nas repercussões políticas de suas ações do que
em produzir justiça. Segundo analistas políticos, o vazamento
possivelmente foi realizado por algum partidário de Aécio
infiltrado na PF ou na PGR, como modo desesperado de alertar os
companheiros de tunga e, assim, permitir a ocultação de provas.
As
novas delações, ao lado de provocar talvez o maior terremoto
político da história nacional, desmoralizam o modus operandi da
República de Curitiba. A PGR de Brasília mostra para o Brasil como
se faz investigação com base em delação premiada. Os delatores
não foram presos preventivamente. Suas famílias não foram
perseguidas. Não se apreendeu tablet do neto de ninguém. Não
houve necessidade de tortura psicológica. As delações foram
realizadas em sigilo.
Moro
e seus seguidores ficam, a partir de agora, com a brocha na mão;
espera-se que tenham a vivacidade de perceber que não há mais
parede para pintar. Como comparar a imensidão corruptiva desvelada
pela JBS com as traquinas, as insignificâncias perseguidas por Moro
com tanto ardor? Imóveis em nome de outros, barquinhos de alumínio,
pedalinhos de criança, as tralhas recebidas de presente por Lula,
como continuar essa pantomima farsesca sem cair cada vez mais fundo
no ridículo do judiciário mundial?
A
partir da exposição das provas incontestáveis produzidas na
operação JBS, o que dirão, agora, os tolos que propagandearam por
anos a mentira de que Lulinha era o dono da Friboi? Ou de que o PT
era a maior organização criminosa política da história do país?
Tal tese implica, primeiro, fechar os olhos para as provas
incontestáveis, produzidas na própria Lava Jato, que demonstram que
a promiscuidade entre empresários e políticos remonta a Cabral. No
máximo, e de forma injusta, pode-se culpar o PT por ter aderido ao
modelo ou não tê-lo impedido, nada além disso. Segundo, importa
aquiescer com a ideia esdrúxula de que personagens secundários, que
nem do PT eram (PMDB) ou nem no governo federal estavam (PSDB),
receberam centenas de milhões de reais em propinas, enquanto o chefe
da quadrilha se contentou com um apartamento e um sítio em nome de
terceiros, imóveis, aliás, de classe média, baratos.
Porém,
passado o susto inicial, tenta-se equilibrar a balança política.
Para suavizar a situação dos amigos, buscam envolver o PT na
história. O problema é que, em relação ao PT, a Lava Jato de
Brasília abdica da mesma inteligência e eficiência demonstrada
quanto a Temer e Aécio. Para incriminar Lula e Dilma, Janot utiliza
a surrada cartilha da República de Curitiba que deu azo àquela
malfada capa de Veja: "Eles sabiam".
Janot,
como grande parte dos operadores da Lava Jato, é antiesquerdista e
suas ações são direcionadas para proteção do mesmo modelo de
neoliberalismo admirado por Moro. Para que o projeto prossiga sem
percalços, é preciso destruir a hipótese Lula nas eleições
presidenciais, que agora aparentam estar perigosamente mais próximas.
O
padrão de investigação e busca de provas que incriminaram Temer e
Aécio foi de eficiência. Produziram-se provas muito fortes que
chegaram aos próprios acusados, gravados em conversas
comprometedoras. "Tem que ser um que a gente mate antes de
fazer delação" diz Aécio Neves em um dos grampos,
referindo-se à pessoa que receberia o dinheiro sujo que ele pediu,
segundo notícia publicada na imprensa. A ser confirmada a notícia,
trata-se de coisa costumeiramente dita por mafiosos e traficantes de
droga, não daquilo que se esperaria de um senador da República.
Esse
tipo de prova dificilmente será apresentado no que concerne à Lula
ou Dilma.
As
novas acusações contra Lula e Dilma seguem o modelo de Curitiba:
"delator disse isso" e "delator disse aquilo".
Prova material? Nenhuma. Como sempre, só a palavra dos delatores.
Ora,
o delator da JBS diz que havia uma conta com milhões de dólares
para Lula e Dilma, o que torna fácil demais a investigação:
apresenta-se o número da conta e solicita-se o extrato da conta. O
problema é que certamente a conta está em nome da própria JBS ou
do delator, assim como o triplex está em nome da OAS. Nesse caso, há
que se provar que algum dinheiro da conta apontada chegou nas mãos
de Lula ou de Dilma. Fora isso, a presunção é de inocência e a
acusação, de tão frágil, não deveria sequer ter chegado às
manchetes. Aceitar a palavra do delator, nessas circunstâncias,
torna fácil para qualquer um acusar sem responsabilidade penal pela
eventual possibilidade de mentira: o delator apresenta um bem próprio
e diz que ele pertence a Lula ou a Dilma. Pergunta-se, por que esse
modelo de propina somente é utilizado por Lula e Dilma? Por que os
demais corruptos não deixaram o produto da corrupção em nome dos
corruptores? Seria um novo modelo de corrupção superinteligente, no
qual o dinheiro da corrupção nunca sai do patrimônio do corruptor?
Aguardemos
o desenrolar das acusações contra Lula e Dilma.
Quanto
aos acusados em face dos quais efetivamente existem provas, Aécio é
afastado do Senado, mas não é preso, ainda que sua conduta seja
mais grave do que a do Delcídio (sugerir a morte de testemunha é
gravíssimo). Quanto a isso, o problema é o desequilíbrio no
tratamento, mas penso que a segurança jurídica orienta para a
liberdade dos acusados enquanto não houver condenação transitada
em julgado. É o custo dos direitos e garantias individuais: alguns
culpados se beneficiam, mas milhares de inocentes deixam de ser
presos injustamente.
Paralelamente,
apesar da gravidade das acusações e da existência de provas
robustas contra si, o vampiro resiste a sair da luz do sol, o que o
fará se queimar cada vez mais. Temer diz que não renuncia e não
renuncia, repete. O que isso significa? Que ele supõe que poderá
permanecer no poder? Claro que não, ele tenta apenas se valer do
cargo para se imunizar pelo tempo que puder. Ao se agarrar à
presidência, nos obriga apenas a aturá-lo por mais uns vinte dias.
Temer
é um produto com data de vencimento estabelecida: entre os dias 6 e
8 de junho ocorrerá o julgamento da impugnação da chapa
Dilma-Temer no TSE. Antes, era dado como certo o desmembramento da
chapa para condenar apenas a Dilma e livrar o Temer. Agora, com esse
complicador da JBS, o julgamento se tornou o meio mais célere e
institucional para defenestrá-lo de Brasília. Os ministros do TSE
dificilmente perderão essa chance.
O
problema é que, depois, ficaremos com Rodrigo Maia até a eleição
de um presidente para o mandato tampão. Em princípio, eleição
indireta, mas, se o povo pressionar nas ruas, pode ser que aprovem as
diretas.
Há
os que invocam a hipótese "Volta, querida". Sem dúvida
alguma, a anulação do impeachment e o retorno de Dilma à
presidência seria o melhor caminho, o mais adequado, o mais honesto.
Erraram, pois que consertem o erro e devolvam ao povo a mandatária
que escolheram. Existem ações que visam a declaração de nulidade
do processo de impeachment. Com vontade política, bastaria ao
STF pô-las em pauta com a urgência que o caos político exige e
julgar procedente o pedido. Pronto, o vampiro sairia e Dilma
retornaria de forma institucional e constitucional. A chance disso
ocorrer, porém, é próxima do zero. O STF é majoritariamente
conservador, antiesquerdista e, mais do isso, antipetista.
A
hipótese mais provável é que Temer seja defenestrado pelo TSE, no
julgamento da chapa Dilma-Temer. Se isso se confirmar, seria a
segunda oportunidade na qual o "glorioso" STF permitiria,
em pouco mais de um ano, que um desqualificado chegue ao mais alto
cargo público do país e nele instale a sua quadrilha. Empossado na
presidência provisória, Rodrigo Maia, filho e genro de políticos
da pior estirpe, articulará para ser eleito indiretamente e, com a
caneta na mão, suas chances são grandes. Se não houver rebuliço
nas ruas, provavelmente será eleito. O povo nas ruas, exigindo
diretas, é capaz de mudar esse destino provável.
A
possibilidade de eleições direta antecipadas deve estar deixando
Sérgio Moro irritadíssimo com a delação da JBS. Todo o seu
calendário, milimetricamente planejado, pode ter ido para o brejo.
Se Temer cair e tiver eleições diretas ainda esse ano, não haverá
tempo para condenar Lula com decisão definitiva em 2º grau. Como
segurar o "sapo barbudo"?
Fazer
o quê, né? Shit happens.
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