
Quanto
tempo em nossas vidas perdemos imaginando como ela deveria ser ao
invés de aceitá-la como é? Quantos os dissabores lutando batalhas
de futilidades, de insignificâncias? Queremos tanto enxergar um
determinado mundo imaginário, sofregamente ambicionado, que nos
cegamos para o mundo real. Às vezes, recusamos aceitar que o mundo
real é, na verdade, o mundo de nossos sonhos. Um mundo que custa
enxergar porque, atarantados em busca de inconcretas vaidades, sequer
lembramos que temos algo inefável em nosso espírito, uma visão
especial que permite vislumbrá-lo: o olhar da emoção. É ela a
única que expõe por inteiro a verdadeira natureza das coisas, das
pessoas, de tudo que nos cerca. Somente as coisas que emocionam
realmente existem, tudo o mais é ilusão ou mentira. E se alguém
não se emociona com nada e nada lhe toca o coração, a própria
irrelevância a torna inexistente, porque existir sem sentimento é
como não existir.
Ser
humano é mais do que simplesmente estar no mundo. Ser humano é
estar aqui emotivamente. Ser humano implica estar em relação
afetiva com tudo que o cerca. O mundo ideal, como o imagino, onde
reinam a paz e o amor, não é algo post mortem, a ser alcançado
somente após uma vida de penitência. O mundo ideal, dos sonhos, é
esse aqui mesmo, essa é nossa chance, talvez a única. A montanha
que devemos subir para alcançar esse pico tão alto, nosso Shangri-la, encontra-se dentro de nós mesmos e para o sucesso dessa
escalada temos de superar os caminhos pedregosos da ambição, as
lajes escorregadias da vaidade, as nevascas da ausência de compaixão
e de amor pelo próximo, a subida íngreme e cansativa da soberba e
da ostentação e a fome e a sede de poder e glória. A felicidade, o
amor e a paz estão nesse pico, que quase não conseguimos enxergar,
de tão longe que aparenta estar. Mas a distância que nos separa
dele é ilusória e inversamente proporcional ao nosso desprendimento
material e a nossa vontade de fazer o bem e não magoar ninguém.
Quanto mais nos lixamos para frivolidades e nos importamos com a
manutenção da beleza e com os sentimentos das pessoas, mais nos
apercebemos da proximidade do paraíso desejado e assim passamos a
vê-lo com facilidade. Porque aí estamos mais perto da beleza. E ver
o mundo de nossos sonhos somente é possível a partir do momento em
que enxergamos a beleza das coisas como elas são.
Quando
lágrimas de emoção caem espontaneamente de nossos olhos pela
simples visão de uma paisagem magnífica, esse é o mundo dos
sonhos. Lágrimas de felicidade e emoção sinalizam um momento de
perfeita visibilidade. Quando as temos, estamos vivendo a vida real.
Muitas
pessoas desperdiçam a vida perseguindo potes de ouro ao fim do
arco-íris, tarefa inatingível. Nunca saímos do éden, apenas
deixamos de enxergá-lo pela cegueira do vício. Mas se pararmos para
refletir sobre o que realmente nos importa e fixar nessa coisa
importante um olhar terno por alguns instantes, uns momentos apenas,
de repente um mundo completamente novo surgirá à sua frente. O
paraíso. Creio que cada pessoa deve ter um paraíso próprio,
diferente.
O
meu paraíso, descobri um dia sem querer olhando para algo
extremamente corriqueiro e comum para mim: minhas filhas e minha
mulher conversando entre si. E foram os olhos da emoção que me
fizeram enxergar esse paraíso antes escondido. Um dia, fiquei
observando-as enquanto conversavam animadamente, brincando umas com
as outras e comigo, o modo como riam, a leveza dos gestos. Entendi
que elas eram felizes e isso, sabê-las felizes, encheu-me de tamanha
ternura que o véu que havia em meus olhos dissolveu-se em lágrima.
E
pude, talvez pela primeira vez em minha vida, enxergar o céu.
Percebi
que era ali, em minha própria casa, onde vivem minhas filhas e minha
mulher, que habita a minha felicidade. Mas o meu paraíso de paz e
felicidade não é minha casa, que tampouco é o meu castelo.
Castelos evocam medo e necessidade de segurança.
O
jardim do meu éden é o mundo onde habitam minha esposa e minhas
filhas. Onde elas estiverem, lá será o meu paraíso e meu lugar.
Compreendi,
então, que o paraíso, para mim, encontra-se no olhar das pessoas
amadas.
Para outras pessoas o paraíso será diferente do meu, mas
tenho certeza que jamais estará ele em algo, senão em alguém.
Marcinho,
ResponderExcluirQue lindo amigo, quanto mais lia mais eu achava lindo e me emocionava.
So uma pessoa linda como vc poderia escrever assim.
beijos com toda minha admiracao,
Ariza
Ariza, você é uma pessoa cujos sentimentos estão à flor da pele, extremamente sensível, uma alma gentil e cheia de vontade de agradar aos que estão à sua volta.
ResponderExcluirObrigado.