Às
vezes a vontade é a de não sentir nada. Deixar de processar o
antigo e parar de experimentar o novo. Anestesia geral na alma.
Mudar
de vida, mudar de nome, mudar de alma. Mudar tudo, de ponta à
cabeça.
Morar
num cubículo no Japão, solitário, sem falar uma palava de japonês,
só para ter a certeza absoluta da incomunicabilidade. Como amiga,
somente a solidão, a insidiosa companhia que pouco a pouco vai se
tornando agradável, a cada momento com ela passado.
Outras
vezes vem o desalento, as dúvidas sobre o valor da persistência, as
dúvidas sobre o próprio valor.
Por
que falar o que se fala, cantar o que se canta, escrever o que se
escreve?
Porque,
se tudo já foi falado, já foi cantado ou já foi escrito, com mais
e maior brilho, profundidade, intensidade e emoção?
É
possível que todo ser humano tenha um desses momentos de desespero
humano pela constatação do non sense da existência. Talvez não.
Pode
ser, porém, que num desses momentos se esteja próximo a algo
prazeroso, quem sabe o rosto de uma pessoa amada, ou uma linda
paisagem admirada, quem sabe uma obra de arte.
São
tantas, inumeráveis, as coisas belas potencialmente causadoras do
prazer humano.
E,
nessa busca pela percepção de cada minúcia da coisa prazerosa, com
vagar, a compreensão se inicia, como sempre ocorre, com indagações
desprovidas de respostas certas, às vezes sem resposta alguma.
Por
que o sorriso do ser amado produz esse efeito tranquilizador na alma
de quem ama?
Por
que a bela vista de majestosa montanha impacta o espírito de forma
tão intensa?
Por
que a obra de arte causa o deslumbramento, a admiração e a sensação
de beleza que captamos com nossos sentidos?
A
compreensão começa assim. Pela percepção de que, assim como é
única a paixão provocada na alma de quem aprecia o que é belo, não
há uma única coisa desse mundo que não seja única em si mesma.
Toda
pessoa é única, toda obra é exclusiva, nada é exatamente igual ao
que já existiu. Criação e conhecimento obedecem a uma ordem
singular, onde tudo que é pretérito é causa do futuro e tudo que é
futuro é, assim, um produto do passado.
Os
saltos espetaculares e perigosos existem, mas os degraus constituem a
mais comum e segura forma de subir.
Nada,
nem ninguém, é igual a qualquer coisa que existe ou já existiu.
Nada do que se fala é igual ao que já se falou, Nada do que se
canta é igual ao que já foi cantado. Nada do que se escreve jamais
antes foi escrito.
Compreende-se,
então, numa epifania, que toda criação é, por assim dizer,
coletiva, que a existência individual não somente faz sentido, como
possui imenso valor, pois cada pessoa é exclusiva, única, e tudo o
que irá sentir e experimentar é também sem precedentes.
Tudo
o que cada pessoa tem a falar, cantar ou escrever, jamais foi antes
falado, cantado ou escrito, não daquele modo, não daquela forma,
nunca igual.
Toda
ação sua será, assim, um presente para o mundo, ainda que o mundo,
em princípio, não entenda a mensagem. Isso não importa, o presente
a mensagem, estará dada.
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