segunda-feira, 28 de setembro de 2015

O limite do possível político


Exagera quem considera que está ocorrendo uma grande derrota das forças progressistas brasileiras por culpa das dificuldades do PT em se manter coerente ao seu projeto utópico original.
As conquistas do PT no governo federal não se resumem ao aumento do consumo, proporcionado pelo inegável incremento da renda. Longe disso...
Primeiro, é preciso deixar claro que esse aumento de consumo não pode ser confundido com o consumismo da classe média e da classe rica, superficial e fútil. Trata-se de consumo de bens de primeira necessidade, como alimentos. Assim, trata-se, no fundo, de melhoria na condição alimentar da população pobre, notadamente entre as crianças, o que implica melhora na saúde geral dessa população.

Segundo, existem reformas de base, silenciosas, que somente falarão daqui dez, quinze anos. Além das obras de infraestrutura que se testemunha em praticamente todas as grandes cidades do país, com impactos futuros em saneamento básico e também na saúde da população, o que dizer quanto à repercussão futura de projetos como "Minha casa, minha vida", "Caminhos da Escola", Prouni, multiplicação das escolas técnicas, Fies, "Mais médicos" e transposição do São Francisco, para ficar nesses exemplos? São projetos e programas que, se perdermos um pouco de tempo na internet, veremos que estão dando certo e aos poucos começam a mudar vidas e mentalidades. Nada disso tem efeito imediato na sociedade.
Por outro lado, modificações profundas e imediatas em qualquer sociedade somente são alcançadas via revolução violenta. Se não é isso que se deseja, se a pretensão é de modificações que conduzam à redução das desigualdades sociais num ambiente de paz, sem drásticas rupturas institucionais, a única alternativa é a progressividade, com pequenas abocanhadas ocasionais no stablishment à custa de concessões à elite. Essa foi a estratégia do Lulinha Paz e Amor e, a meu ver, foi acertada. Aparentemente, Dilma está seguindo a cartilha, talvez com um certo exagero nas concessões.
Ao custo desse modelo pacífico, é possível dizer que o PT chegou ao poder e os que eram ricos permaneceram ricos e, talvez, ainda mais ricos. Mas, e daí?
Isso sempre ocorreu. A diferença é que, dessa vez, algumas coisas foram produzidas em benefício dos desfavorecidos, tanto no aspecto do incremento na renda, como através da realização dos programas que mencionei, além de outros.
Não se pode pretender, a não ser ingenuamente, que a primeira investida contra essa estrutura podre vá direto na jugular dos ricos, que é o seu bolso. Então, começar pelo fortalecimento dos pobres, através do acesso a alimentos e à educação, parece-me um boa tática de enfrentamento. Depois a gente vê o que essa gente, agora fortalecida, é capaz de fazer.
Paralelamente, no que concerne à aparente perda de apelo do governo junto ao povo, não se pode pôr de lado o cansaço natural de qualquer governo há doze anos no poder e que irá chegar a dezesseis quando da nova escolha. Esse cansaço, aliado à talvez mais incansável perseguição midiática já testemunhada contra um partido, pode de fato produzir estragos eleitorais enormes na próxima eleição presidencial. Repito: e daí?
Presumindo-se que o PT perca as eleições de 2018, o que fará o próximo partido no governo? Poderá impunentemente acabar com todos esses avanços sociais? Poderá retroceder na agenda social, mitigando ou cessando a entrega de pequenas fatias do bolo aos pobres? Se optar por isso, dificilmente o próximo partido governante passará dos oito anos de praxe na presidência e provavelmente veremos o PT, ou outro partido de esquerda, retornar aclamado pelos pobres.
Enfim, acho que o projeto de esquerda apenas começou. Trata-se de um projeto sem volta no qual esses primeiros dezesseis anos constituem somente a primeira etapa. Falo dezesseis anos pois estou convicto de que, de fato, ninguém quer o impeachment, querem apenas enfraquecer o PT.
Talvez haja razão quanto à afirmação de que faltou algum empenho do PT em provocar e liderar reformas mais profundas. Também tenho um pouco esse sentimento de frustração. Todavia, talvez isso decorra simplesmente da ausência de informações mais profundas e reais sobre a verdadeira estrutura de poder que se esconde por trás da mera aparência. Talvez estejamos testemunhando o limite do possível político.

Na dúvida, depois de doze anos de experiência com o governo do PT, a esquerda ainda tem o meu voto, já que em mais de quinhentos a direita não cumpriu a sua própria utopia.

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