Lamentável
a violência ocorrida no episódio no qual o deputado Takayama
(PSC-PR), de 67 anos, acabou levando um soco do motorista do senador
Delcídio do Amaral (PT-MS) nas vias de acesso ao Congresso Nacional.
Não
é possível defender ou justificar qualquer violência, muito menos
quando verificada a desproporcionalidade física entre os envolvidos.
O deputado, afinal, é um idoso.
Porém,
as imagens captadas pelo sistema de segurança da Polícia
Legislativa do Congresso são inquestionáveis. Os vídeos, que foram
divulgados, claramente comprovam que: (a) não houve manobra de risco
acentuado por parte do motorista quando dirigindo; (b) o deputado
inicia a agressão ao desferir um tapa ou um soco no motorista, que
somente então revida.
Além
disso, aparentemente as lesões derivaram mais da forma com que se
deu a queda do deputado, do que propriamente do soco que recebeu.
Em
princípio, não cabe tecer considerações sobre fatos que não
testemunhamos diretamente. As verdades são múltiplas e possuem
tantas versões quantas são as pessoas que as contam.
Contudo,
talvez porque o motorista sirva a um parlamentar do PT, ele está
sendo massacrado pela opinião pública como um agressor de idosos.
Assim, cabe levantar um contraponto.
Não
conheço o deputado agredido, muito menos seu caráter, mas sabemos
sobre a natureza geral das micro e macro relações de poder em nossa
sociedade, brilhantemente destrinchadas por Sérgio Buarque de
Holanda, em seu obrigatório Raízes do Brasil, e classificadas como
hierárquicas e autoritárias, herança da cordialidade dos ibéricos.
Cordial, de coração, ou seja, não pela simpatia e solicitude, mas
pela abandono da razão em favor da paixão e da emoção. Afinal,
coração é, antes de tudo, um órgão sanguíneo.
Dada
essa herança ibérica, gostamos de mandar e também do seu correlato
lógico, que é obedecer. Como afirmou recentemente aquela madame que
representa o sindicato das patroas das empregadas domésticas sobre
essas últimas: as pessoas precisam se colocar nos seus lugares. Em
outras palavras, à casa grande o que é da casa grande e à senzala
o que é da senzala, só para fazer remissão a outra grande obra
sócio-antropológica.
Se
entendermos o gesto do parlamentar idoso dentro desse contexto de
interrelação de poder - quem manda, quem obedece -, é forte a
presunção de que, talvez, ciente de sua condição de mais
poderoso, afinal, deputado e, muito provavelmente rico, certamente
mais rico do que o motorista, tenha assumido que podia agredir uma
pessoa desfavorecida, inferior nessa visão hierárquica e
autoritária que predomina em nossa sociedade, e sair impune, porque,
afinal, ele é branco, rico e poderoso.
Quantos
possuem a tolerância necessária para receber um tapa na cara e não
revidar? Fosse um idoso carcomido, nitidamente enfraquecido pela
idade, talvez, mas não é o caso.
Só
que o poder tem muitos modos. Um deles se manifesta pela supremacia
da força física, que quem nesse caso detinha naquele momento era o
motorista.
Não
há santos nessa história, mas se há alguém com uma dose um pouco
menor de culpa, aparentemente é o motorista.
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