domingo, 25 de setembro de 2022

O amor convertido em voto para curar o ódio bolsonarista

 

Ao final da entrevista que concedeu no Programa do Ratinho, no SBT, dia 22 de setembro, Lula pediu aos eleitores que comparecessem às urnas para nelas depositar amor e esperança na forma de voto. Por que um candidato ao maior cargo eletivo do país se preocuparia em invocar o amor no ato de votar? Amor é um sentimento necessário para a consecução de um projeto político de país? A resposta, sem sombra de dúvida, é sim; o amor é essencial em todas as relações humanas e, em especial, o Brasil necessita e clama desesperadamente pelo retorno do amor ao seio de nossa sociedade.

A invocação do amor se torna necessária nessa eleição porque, na anterior, em 2018, infelizmente a maioria do eleitorado optou pelo candidato do ódio. Eleito, a defesa do ódio e da violência alcançou a principal vitrine política do país, a presidência da república, com todas as condições políticas e técnicas favoráveis que disso decorrem. A partir daí, para surpresa de ninguém, iniciou-se uma escalada na discórdia, na violência e no armamento.

Materialmente, isso se traduziu em naturalização gradual de ocorrências que antes eram consideradas perturbadoras. Ferir e matar o adversário político, ao que parece, tornou-se lugar-comum, não mais uma causa de horror. Grande parte da sociedade brasileira foi acometida de um desvio psicológico coletivo, quase uma histeria, causadora de distorção no espectro ético-moral que orienta opiniões e ações.

sábado, 17 de setembro de 2022

Eleitores nem-nem e indecisos não podem ir para Paris

No momento em que escrevo (17/09/2022) faltam 14 dias para a eleição. A média das pesquisas mais recentes e idôneas indicam, grosso modo, que Lula está próximo de 50% dos votos válidos, enquanto Bolsonaro passa um pouco de 30%, com Ciro e Tebet disputando o 3º lugar, somando ambos cerca de 12% do eleitorado.

Uma leitura das pesquisas mais elastecida no tempo, todavia, demonstra que, ao longo do último ano, repetidamente Lula apresenta um percentual bastante próximo de 50% dos votos válidos, um pouco aquém ou um pouco além, estando a vitória no 1º turno invariavelmente próxima dos limites da margem de erro. Assim, embora haja uma sinalização da possibilidade de que a decisão final seja carregada para o 2º turno, igualmente indicam que qualquer espirro eleitoral em seu favor determinará a vitória de Lula no 1º turno. Em outras palavras, a possibilidade de vitória no 1º turno está na caixa de Schrödinger fazendo companhia ao gato. As chances de ocorrer ou não são equivalentes.

Justamente em função dessa proximidade, com chance real de pôr um fim no mandato do atual presidente logo no 1º turno, as redes sociais entraram em polvorosa, com eleitores e simpatizantes da candidatura do ex-presidente pressionando os eleitores, principalmente os que se inclinam a votar em Ciro Gomes, para que adiram ao voto útil em Lula, assim pondo um ponto final precoce no bolsonarismo no poder. O motivo pela preferência pelos eleitores de Ciro é que, em princípio, são considerados eleitores de esquerda, portanto, contrários a Bolsonaro. Tebet e a maioria dos demais candidatos que apresentam mais do que traço nas pesquisas, ainda que tenham adotado um discurso de oposição, estiveram até recentemente com os pés atolados no bolsonarismo, o que, em princípio, implica serem adeptos do mesmo modelo, talvez apenas um pouco menos fétido.

O bolsonarismo sem Bolsonaro

    

    Obs: Texto publicado primeiramente no jornal GGN, em 16/09/2022

    Há um ano as pesquisas eleitorais vêm, consistentemente, indicando que os eleitores brasileiros não renovarão o mandato do atual presidente. Contudo, é preciso adotar a máxima cautela. A eleição somente se vence após a contagem dos votos. O próprio primeiro mandato de Bolsonaro recomenda essa precaução. Além disso, uma vitória sobre Bolsonaro não significa exatamente vencer o bolsonarismo. Vejamos.

    Nos idos de 2016 e 2017, Bolsonaro surge como candidato a presidente vindo do ponto mais profundo das entranhas do baixo clero do parlamento federal, no qual integrava o chamado "centrão", bancada composta por deputados de diversos partidos distintos, todos sem expressividade política individual na Câmara, mas que juntos, legislatura após legislatura, desde a constituinte de 1988, usam a força conjunta de seus votos, e o consequente potencial de travar os projetos do Executivo, para chantagear todos os presidentes eleitos desde então.

    Parlamentar absolutamente medíocre, com um índice de atuação aquém do desidioso, tendo apenas um par de leis de sua iniciativa aprovadas em 30 anos de atividade parlamentar, mesmo essas sendo desimportantes para o povo, conseguiu a incrível façanha de se apresentar como novidade política e vender-se como capaz de comandar a então 8ª economia do mundo. O ditado da raposa se candidatando a cuidar do galinheiro nunca fez tanto sentido.

Lula não é anticristo, nem bicho papão

Obs: Texto publicado primeiramente no jornal GGN, em 29/08/2022.

O que exatamente as pessoas imaginam ser uma “família feliz”?

Abordo o tema em função do excelente artigo É preciso falar com os evangélicos1, da socióloga Esther Solano, publicado na Carta Capital e objeto de matéria no GGN, cuja leitura é altamente recomendada. No artigo, Solano pontifica sobre a necessidade de estancar o “pânico moral” que a equipe e os simpatizantes de Bolsonaro induzem diuturnamente no seio do eleitorado evangélico, vendendo a ideia de que Lula e o PT são uma ameaça à família.

Segundo Solano, precisamos nos esforçar para convencer o povo cristão que ainda conserva a capacidade de reflexão, ou seja, a maioria que não é bolsonarista-raiz, de que o discurso que coloca Lula na condição de ameaça à família é uma falácia, uma fraude. Não é uma tarefa fácil, pois, em grande medida, a disseminação do pânico moral anti-Lula parte de pastores evangélicos, principalmente os mais raivosos, que costumam misturar política com religião e transformar seus púlpitos em palanque, desonrando a memória de Cristo. Trata-se de demonstrar a má-fé justamente daqueles em quem os evangélicos deveriam confiar plenamente. Não merecem essa confiança e direi por quê.

segunda-feira, 22 de agosto de 2022

Derrota e fuga de Bolsonaro: que sonho incrível!

A ascensão do bolsonarismo ao poder foi a coisa mais deletéria a acontecer com o país desde a ditadura militar. Num país que vinha, desde o governo Collor, aos poucos se afirmando perante o mundo e se colocando como modelo em termos de respeito às instituições democráticas, nas pautas igualitárias, na gestão dos recursos ambientais e na mitigação da desigualdade social, a eleição de um representante do pensamento protofascista bolsonariano foi um balde de água fria e uma frustração política gigantesca.

O representante máximo do bolsonarismo, ora presidente, é uma figura política grotesca que dificilmente encontra comparação no Brasil e no mundo. Seu pensamento é medieval, absolutista. Contra o Estado laico1, defende a prevalência da visão religiosa também no plano político. Essa visão teocrática, dogmática e indiscutível por natureza, é exatamente o que ocorria no passado e ainda ocorre atualmente, como são exemplo os países muçulmanos.

O pensamento bolsonariano é, antes de tudo, em sua essência, antidemocrático. A vida toda Bolsonaro pregou que, eleito presidente, daria um golpe no dia seguinte, fechando Congresso e Supremo, os dois outros poderes da república. Em outras palavras, tornaria-se um ditador. Por isso mesmo, nenhum eleitor do bolsonarismo pode afirmar-se democrata, pois se utiliza da democracia apenas para a ela pôr fim, destruindo as liberdades civis.

Embora tenha se tornado um certo lugar-comum, não há como falar da ameaça bolsonarista sem indicar o nazismo alemão como exemplo das possibilidades. Afial, trata-se do mais importante modelo histórico negativo do que pode decorrer da omissão ou pouco-caso de cidadãos e eleitores com políticos de orientação despótica que manejam o discurso moralista cristão para alavancar seus projetos de dominação. Hitler e o nazismo não teriam matado milhões de judeus, ciganos, homossexuais e outras minorias políticas se os alemães brancos e cristãos tivessem repudiado, desde o nascedouro, essa excrescência política. Em seu livro autobiográfico, escreveu Hitler2:

domingo, 21 de agosto de 2022

Invasão da Ucrânia, guerras híbridas e o retorno da guerra fria

 

Immanuel Wallerstein, sociólogo norte-americano autor do livro O Declínio do Império Americano, sustenta que a sociedade humana está no limiar de uma profunda alteração no modelo de sociedade. Segundo ele, há um esgotamento do modelo capitalista, o que conduzirá a humanidade a uma encruzilhada na qual deverá optar por um novo modelo, aparentemente com duas alternativas: (a) retorno ao regime de poder centralizado e excludente similar às monarquias absolutas e seus estamentos hereditários; ou (b) criação de uma sociedade focada na dignidade humana, com redução das diversas desigualdades (econômica, cultural, racial, sexual, etc). A primeira opção de sociedade será adotada se a narrativa dos ricos for vitoriosa, o que Wallerstein denomina de “espírito de Davos”. Caso os pobres vençam essa guerra, estabelecendo as bases ideológicas da nova sociedade, será a vitória do “espírito de Porto Alegre”. Em outras palavras, trata-se de uma guerra que poderá definir a ascensão de um modelo de sistema social opressivo, tipo medieval, ou de um sistema libertário, inovador, sem paralelos na história.

A guerra em direção à mudança do modelo socioeconômico já se iniciou há tempos, supostamente desde a derrubada das torres gêmeas americanas, em 2001. São exemplos de batalhas narrativas as primaveras árabes, as jornadas de junho de 2013, a operação Lava Jato e, agora, a invasão da Ucrânia, dentre inúmeras outras. É chamada de guerra híbrida porque, embora possa ocorrer o uso de forças armadas convencionais e seus indefectíveis armamentos, sua maior arma não são os mísseis balísticos, mas a desinformação, a distorção dos fatos, o uso da pós-verdade. O objetivo é a manipulação do pensamento de todo um povo, conduzindo-o, não somente a aceitar, mas a desejar uma mudança que lhe é desfavorável, sendo benéfica apenas ao capital.

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2022

Putin atirou no próprio pé?

 

No artigo "Putin será derrotado", Aldo Fornazieri, professor da Escola de Sociologia e Política (Fespsp), defende a tese, em resumo, de que, ao invadir a Ucrânia e desestabilizar a região, Putin contribui dá um tiro no próprio pé, pois fortalece a OTAN por reforçar o argumento de sua necessidade.

Como análise do "dever ser", perfeita a crítica do Aldo às ações russas na Ucrânia. Como entendimento do "é", apresenta-se um tanto poliana.

Não se sabe por quanto tempo os EUA conseguirão dar sobrevida à sua economia, mas dificilmente passará uma ou duas décadas até que desmorone por completo.

sábado, 26 de fevereiro de 2022

Putin abusou?

 

O lead do artigo "A guerra da Ucrânia, a mídia e os heróis e vilões da Marvel", do jornalista Luis Nassif, publicado no jornal GGN, é o seguinte:

"Com essa preparação, é possível que se chegue ao final da linha concluindo que Putin, de fato, abusou, quando ordenou a invasão.

Mas se sairá desse padrão de tratar o comandante de um dos países mais poderosos do planeta, como um mero descontrolado de boteco".

O grande "xis" da questão colocada por Nassif se desdobra no seguinte: teria mesmo Putin abusado geopoliticamente ao ordenar a invasão da Ucrânia? Havia outros meios de enfrentar o poder que se quer hegemônico dos EUA?

Ambas as respostas, segundo creio, passam pela negativa e explico.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2022

A elite empresária: razão e insensibilidade

 

Esqueça-se a responsabilidade social e política da mídia, o compromisso com fatos e valores democráticos, e fixemo-nos apenas no vetor negócios”.

O jornalista Luís Nassif invoca a reflexão acima no artigo “A Lava Jato e o desmonte da credibilidade da mídia”, publicado no jornal GGN. Nele, aborda-se a questão da perda, pela grande mídia, em meros quatro anos, de quase 70% dos leitores, agudizando um fato que já vinha antes, de modo mais lento, se desenvolvendo consistentemente. Segundo a inteligência da matéria, o súbito incremento da velocidade da queda se explicaria, com alto grau de certeza, pelo alinhamento acrítico e, portanto, dolosamente irresponsável, dos “jornalões” às ações ilícitas cometidas pela operação lava jato. A partir daí, a debandada dos leitores tornou-se uma avalanche montanha de credibilidade abaixo.

O presente texto objetiva responder à provocação de Nassif, ou seja, refletir sobre as motivações subjacentes de alguns poderosos empresários brasileiros que parecem gastar mais energia com questões políticas menores (pois nada há mais importante e emergente do que combater a miséria, a fome e, principalmente nesse momento histórico, fornecer saúde pública em quantidade e qualidade) do que com o sucesso dos próprios negócios. Embora Nassif tenha mirado nos donos da grande mídia, porque, claro, são os que mais se expõem justamente em função da atividade que desenvolvem, o mesmo espanto reflexivo, porém, deve ser direcionado aos demais membros da elite empresária brasileira, nossos bilionários, pois praticam ações similares com idênticos móveis subjacentes. É espantoso verificar que, embora reconhecendo o inegável direito da elite empresária possuir posicionamento político explícito, muitas gestores demonstram despreocupação com o dever de zelo pelo próprio empreendimento e, conforme o caso, pelo compromisso que tem com os acionistas na obtenção de lucro. Em lugar de guardar um distanciamento seguro dos posicionamentos políticos de alta controvérsia, emanados das diversas cores do espectro político, social e partidário, dos cidadãos, atiram-se de cabeça na guerra política, assumindo alinhamentos que se opõem, não somente ao pensamento, mas a interesses e necessidades de milhões e milhões de brasileiros e brasileiras, de todas as etnias, gêneros, credos e inclinações. Agindo assim, correm o risco de contrariar o principal objetivo empresarial, a razão de ser do próprio negócio, que é arregimentar o maior número possível de clientes. Alguns já foram alvos de boicotes explícitos dos consumidores.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2022

Conceitos-chave para a interpretação da realidade Parte III

 


Esta é a décima parte da série “Indivíduo, sociedade e a interpretação da realidade”. Os textos possuem um encadeamento lógico, porém permitem a leitura autônoma. Os links para os que desejarem a leitura das nove primeiras partes estão disponibilizados no final do artigo. 

  • Poder

O instinto de sobrevivência induz os animais ao desejo de priorizar a própria necessidade em relação a dos demais seres vivos. Um nome plausível para essa vontade de impor ao mundo o próprio desejo é “poder”. O poder é possivelmente o elemento mais importante a ser considerado na compreensão da realidade. Dada a condição animal do ser humano, não somente carrega essa inclinação egoística, como, em função do estágio de consciência e cultura no qual se encontra, nele ela é potencializada. Pessoas poderosas já mostraram ser capazes de destruir o mundo para a satisfação da própria vontade; estiveram perto de fazê-lo em algumas ocasiões da história. O poder, porém, não está presente somente no ambiente macro. A ambição por controle é um sentimento que permeia praticamente todas as inter-relações humanas; está presente na disputa entre reinos por territórios, mas também quando mendigos competem pelo conteúdo da lata de lixo. Compreender isso é de suma importância para escapar da ingenuidade na análise quanto às motivações, a fim de extrair as camadas de fraude e hipocrisia que encobrem certas ações políticas, muitas vezes realizadas sob os falsos motes de justiça, liberdade e democracia.

sexta-feira, 14 de janeiro de 2022

Chapa Lula-Alckmin é o que temos pra hoje

 


A propósito do intenso debate acerca da possível chapa Lula-Alckmin, deve-se, primeiro, lamentar a invocação de Lula para novamente disputar a presidência do país. Após dois mandatos de sucesso, como presidente de uma das maiores economias do mundo, melhor seria que não mais retornasse a disputas eleitorais como candidato. O seu papel por excelência seria o exercício da condição simbólica de defensor da nação, interna e externamente, como um diplomata de honra, atribuição típica de ex-presidentes de grandes nações. Na verdade, ele até fez isso enquanto pôde, até o ponto em que a hipocrisia política permitiu, cessando apenas quando a atuação em defesa de empresas brasileiras, perante governos estrangeiros, foi criminosamente criminalizada, com evidentes propósitos políticos. Contudo, a conjuntura atual de fato exige a candidatura de alguém com sua estatura e ele parece estar à vontade com o retorno, de modo que de bom grado o povo a está aceitando explosivamente, como indicam as pesquisas. Segundo, estar atento à circunstância que ainda é mera conjectura. A proposta está na mesa, sendo negociada, porém sem definição até o momento. Ao que parece, Márcio França está fazendo o que pode para melar a chapa, ao fazer exigências inviáveis. 

terça-feira, 11 de janeiro de 2022

Ratinho merece o apelido que tem

 


Carlos Roberto Massa possui um apelido bastante curioso: Ratinho. Segundo consta, o apelido vem da infância, decorrendo do péssimo hábito que possuía de roubar as bolas de futebol dos coleguinhas. Ele diz que os meninos também o chamavam de “Feinho”, reconhecendo que era “muito feio”. Ou seja, na infância era um “Ratinho Feinho”. O apelido persistiu na fase adulta. O fato é que, de origem humilde, tornou-se milionário, atuando principalmente na comunicação (com diversas emissões de televisão e rádio) e no agronegócio.

Rico, raivoso, explorador da miséria humana e com linguajar de baixo nível, Ratinho é um típico representante do movimento neointegralista surgido com Bolsonaro, cujos “expoentes” possuem personalidade bem similar à do líder, sendo exemplos Malafaia, o véio da Havan, o deputado brucutu Daniel Silveira, o ex-presidente do PTB Roberto Jefferson e outros. Defendem, via de regra, pautas de defesa da violência policial, redução da maioridade penal, aprisionamento massivo dos criminosos, ausência de investimento em melhoramento de prisões, facilitação para o armamento dos cidadãos, combate à demonstração pública de afetos homossexuais, redução dos direitos trabalhistas e previdenciários, fechamento do STF, fechamento do Congresso, imposição de um governo militar, derrocada do ensino e da cultura, anticiência, antivacina e outras barbaridades desse naipe.