sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Querido Papai Noel


Querido Papai Noel,
Creio ter sido uma boa pessoa durante esse ano. Não matei, não feri, não roubei, fui dedicado e carinhoso à minha esposa e minhas filhas. Tratei meus amigos com consideração e afeto.
De um modo geral, procurei ser tolerante com o próximo (bom, tive vontade de socar aquele estúpido que me deu uma “fechada” assassina no trânsito, mas limitei-me a abaixar o vidro, pôr a cabeça pra fora e xingar a pobre da mãe do desinfeliz... foi mal, Papai Noel).
Bem, tirando isso, acho que fiz por merecer um presente seu, meu bom velhinho. Então, pensei longamente sobre o tipo de presente que gostaria de receber. Você sabe bem, velho Noel, pelas cartas que te enviei, que quando mais jovem desejava presentes caros e modernosos, mas você jamais atendeu meus desejos (como diria o Pernalonga, o que é que há, velhinho? Magoei). Mais experiente um pouco, até recebi alguns, mas aí o encantamento já havia cessado.
Há muito deixei de apreciar presentes pela sua expressão meramente material. Nunca fui e jamais serei descortês a ponto de demonstrar insatisfação com qualquer presente recebido. Todos, caros ou baratos, grandes ou pequenos, embrulhados ou no pacote, sempre são do meu agrado, de verdade mesmo.
Isso porque, segundo penso e sinto, um presente, para além de seu valor intrínseco, simboliza um tempo precioso que uma pessoa despendeu pensando em uma maneira bem legal de agradar outra pessoa. Representa também uma boa intenção. Sim, porque, mesmo antes de pensar em meter a mão no bolso (ou na obra, para o caso de presentes fabricados pelo próprio presenteador) essa pessoa encasquetou com uma vontade: a de fazer algo bom em relação ao outro. Estava, aquele que presenteia, imbuído da vontade de tornar a vida alheia mais feliz, ainda que pelo breve momento em que se rasga o embrulho e se exibe, com um largo sorriso, o presente recebido. Somente por essa preocupação com minha felicidade, sou grato de coração a toda pessoa que me presenteia. Porque aí o presente verdadeiro é a amizade, a dedicação.
Mas, Papai Noel, para ser absolutamente sincero, poucas vezes na vida recebi presentes que de fato tenham-me causado uma imensa satisfação. Afinal, uma camisa é uma camisa, é uma camisa e é uma camisa. E não é culpa do presenteador. É difícil mesmo presentear. Sei disso porque, assim como a maior parte das pessoas, ocupo muitas vezes o outro lado dessa relação, o papel de presenteador.
É uma angústia tentar imaginar um presente que seja ao mesmo tempo bonito, chamativo, incomum, interessante e desejado. E quando você encontra um que reúna todos esses requisitos, pinta aquela dúvida: peraí, esse negócio é bem legal para mim, mas será que fulano vai achar o mesmo?
Já tentei, inclusive, presentear pessoas com coisas fabricadas por mim, para conferir uma carga maior de emoção e pessoalidade no presente. Sei não, recebi uns olhares estranhos e resolvi desistir dessa atividade artesanal.
É, Papai Noel, se eu, que enfrento essa dúvida com poucos presentes, acho angustiante, imagino o problemão que você encara ao lidar com isso multiplicado por bilhões.
O presenteador, no fundo, é um ingênuo. A vontade de agradar é tanta que ele realmente acha que aquela cueca vai fazer toda a diferença. E o bom presenteado é o que demonstra que tudo que ele precisava na vida era justamente aquela cueca.
Mas, Nonô (permita-me essa intimidade), aqui vai um conselho para os presenteados, que peço sua divulgação: não exagerem nos elogios. Certa ocasião, uma amiga presenteou-me com um short bem bacana, enviado através de um amigo comum. Gostei do short, bom para caminhadas. Essa amiga ligou-me no dia seguinte para desculpar-se por não ter comparecido à minha festa de aniversário e perguntou o que achei do short. Eu derramei elogios, dizendo que havia gostado, poxa era um short muito legal, a minha cara, já estava usando, ainda iria usar muito e outras mil coisas. Não é que os elogios foram tantos que ela achou que eu estava zombando do presente porque ela não comparecera à festa? Ficou zangada demais e foi uma dificuldade para convencê-la de que não era desfeita. Bom, de fato acho que exagerei um pouco, mas era um shortinho bacaninha mesmo.
De toda sorte, bom velhinho, creio que essa coisa de dar ou receber presentes ganhou uma dimensão um pouco exagerada em nossa sociedade. Até mesmo aniversariantes, que antes recebiam presentes, agora dão presentes aos convidados. Como diria a Narcisa, que loucura!
E os amigos e inimigos ocultos de fim de ano? É do trabalho, da igreja, da família, do condomínio, do círculo de amigos, ufa, chega... Até você, com sua experiência, cansaria, Papai Noel.
Que tal a gente se reunir nas festas e somente trocar beijos e abraços apertados? Que tal sentimentos em lugar de embrulhamentos? Que tal presentes que possamos compartilhar e, assim, estreitar as relações, como uma garrafa de vinho ou um pernil? Tá legal, sugerir um pernil como presente é um pouco forçado, mas... por que não? Lembra daquela coisa da comunhão, da qual um cara lá do Oriente Médio costumava falar uns dois mil anos atrás? Pois é.
Claro que determinados presentes meramente materiais podem ser perfeitos dependendo da situação. Em minha infância pobre e necessitada, adorava receber roupas novas de presente, ou tênis, ou mochilas. Mas, cá entre nós, dar uma calça de presente para alguém que já possui outras dezenas serve para simbolizar o quê mesmo? Ah, é só para agradar? Que tal um livro, então? Descubra um assunto que a pessoa goste e dê-lhe um calhamaço para ler. Nada como um livro de quinhentas páginas para quem gosta de um determinado assunto (e não seja ansioso).
Concordo que perfumes e flores jamais serão meramente materiais. A beleza das flores e o aroma de ambos são ótimos para alegrar o espírito. Ótimos presentes para mulheres e homens desencanados.
A chave para dar um bom presente é conhecer o presenteado, mas dizer isso não ajuda muito porque infelizmente essa é justamente a maior dificuldade: conhecer o presenteado tão bem assim.
Tudo isso, porém, deixará de ter importância se todos passarem a não dar valor demasiado ao tipo de presente recebido, mas à pessoa que o deu. Pessoas amigas de verdade jamais se magoarão na hora de dar ou de receber um presente.

Bom, Papai Noel, voltando ao fio da meada. Acho que fui bom durante o ano e fiz jus a um presente. Peço que você conserve com saúde, amor, paz e felicidade, essas pessoas tão importantes que são as pessoas que amo, as pessoas amigas. E, de preferência, que continuem próximas de mim, se isso também as agradar. Porque, Papai Noel, minha família e meus amigos são, de fato, o meu real e verdadeiro presente. O resto é lucro (num embrulho bem bonito, que vou rasgar e sorrir, adorando a cueca nova). Um grande beijo, Nonô.

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