Resolvi
escrever sobre a questão que envolveu o deputado federal Jair
Bolsonaro, do PP do Rio de Janeiro, e a Preta Gil.
Para
quem não sabe do que estou falando, trata-se de declarações
prestadas pelo sempre lamentável Bolsonaro no quadro “O povo quer
saber” do programa CQC. Nesse programa, a Preta Gil perguntou o que
ele faria se o filho dele estivesse apaixonado por uma negra. O nobre
deputado não hesitou e disparou as seguintes palavras: “Preta, não
vou discutir promiscuidade com quer que seja. Não corro esse risco
porque meus filhos foram muito bem educados e não viveram no
ambiente como o lamentavelmente é o seu”.
Quem
quiser assistir o vídeo, aqui vai o link:
http://www.youtube.com/watch?v=HyaqwdYOzQk.
Posteriormente,
o deputado voltou atrás e disse que não havia entendido a pergunta
da Preta, achando que ela havia questionado o que ele faria se
soubesse que o filho estivesse apaixonado por um gay.
Não
gosto do Bolsonaro, nunca gostei. Seja como homem, seja como
político, ele representa o que há de pior na espécie humana.
Contudo, assisti à entrevista e acho que ele não entendeu mesmo a
pergunta da Preta. Isso, todavia, não o livra da manifestação
homofóbica, essa sem dúvida presente em seu discurso.
Em
função de suas declarações desastradas, aparentemente alguns
deputados federais assinaram representação contra o Bolsonaro por
quebra de decoro parlamentar por conta do teor racista da declaração
(que entendo ter decorrido de confusão do deputado).
Discordo.
Parlamentares gozam de imunidade material prevista na Constituição
Federal, sendo invioláveis por suas opiniões, palavras e votos.
Ainda que certas declarações sejam deploráveis, considero
perigosas, apenas pelo mau uso da prerrogativa constitucional por
alguns, essas tentativas de cercear a plena liberdade parlamentar de
livre manifestação do pensamento.
Sobre
liberdade de opinião, e não somente dos parlamentares, é sempre
bom lembrar Voltaire: "Eu posso não concordar com o que você
diz, mas defenderei até a morte o direito de dizê-las".
Pode-se
argumentar que a liberdade de opinião não pode significar a
possibilidade de validação de manifestações preconceituosas.
Entretanto, entendo que a mera expressão da opinião não a valida,
não a torna verdadeira ou razoável. E há um ganho com a exposição:
somente através dela é que se torna possível oferecer um argumento
de contrariedade dialética.
Ademais,
se aceitarmos que alguns assuntos não podem ser externados, quem vai
determinar quais assuntos podem ou não ser assumidos ou se
determinada opinião é ou não preconceituosa?
Esse
é o perigo de podarmos a plena liberdade de opinião. Hoje alguém
vai ter o poder de dizer que falar mal de minorias é preconceito.
Amanhã, um outro com o mesmo poder vai afirmar que não pode falar
mal do poder estabelecido.
É
razão suficiente para que ninguém seja punido por suas opiniões.
Punição deve envolver somente ações.
Não
defendo, aqui, a liberdade para ofender. Ofensa pessoal é crime
capitulado no Código Penal (injúria, difamação e calúnia). Falo
exclusivamente em liberdade de opinião, principalmente para os
parlamentares.
Não
é saudável para a sociedade a proibição da discussão desse ou
daquele assunto, desde que o assunto não seja fulanizado. Primeiro,
porque creio que é do confronto de ideias, da dialética, que surgem
os avanços do pensamento humano. Segundo, porque a criação de
assuntos tabus certamente ocorrerá de cima para baixo, o que, além
de não ser democrático, implicará a concessão de poder a alguém
de definição quanto ao que é ou não tabu.
A
criação de tabus enrijece as discussões e dissemina o
obscurantismo ao não permitir a diversidade de opinião. O
contraponto a qualquer pensamento deve se dar a partir da
apresentação de opinião contrária e não através da vedação de
exposição de ideias que sejam discordantes daquelas acolhidas pelo
ambiente estabelecido.
Especificamente
em relação à homossexualidade, apenas como exemplo, digo que,
embora a opção sexual individual deva ser pacificamente aceita por
todos, porque é subjetiva e pertence ao âmbito da liberdade da
pessoa, creio que o tema "homossexualidade", como qualquer
outro, possa ser objeto de opiniões conflitantes. A prática
preconceituosa, a ação discriminativa, é que deve ser vedada.
Não
deve haver restrição de liberdade, inclusive a de opinião, desde
que essa liberdade não acarrete lesão direta a uma específica
pessoa.
Claro
que se pode dizer que uma determinada opinião genérica sobre um
assunto é capaz de atingir o sentimento íntimo da pessoa, mas,
sendo essa a hipótese, essa lesão íntima é tão abstrata e
rarefeita que, tão subjetiva, que não deve implicar redução da
liberdade, sob pena de suscetibilidades individuais emperrarem a
capacidade humana de pensar e expor sua conclusões. Caso contrário,
pode-se começar a pensar em destruir quadros do Picasso, como o
Casal Copulando, ou livros do Richard Dawkins, sobre ateísmo, sob a
mera alegação de abalo moral.
Discordo
de tudo que foi dito pelo deputado linha-dura, todavia defendo que
ele tenha o direito de dizê-lo.
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