quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Médicos estrangeiros - A vergonha da medicina brasileira


A pretexto de "preocupação" com a qualidade da medicina oferecida à população, as representações profissionais médicas vêm adotando e apoiando as mais vis e preconceituosas medidas, o que inclui divulgação de manifestações individuais de médicos contendo insultos e ofensas de natureza pessoal contra médicos estrangeiros, como demonstraram reportagens dos jornais de ontem (27/08/2013).
Longe de constituir um debate válido sobre a qualidade dos serviços médicos disponibilizados, trata-se de pura xenofobia e proteção de interesses cartoriais proveniente de uma classe profissional que é possivelmente uma das mais prestigiadas pela sociedade, tanto que o povo, equivocadamente, pelo invocativo de "doutor", título acadêmico somente merecido pela elite do ensino e da educação formal e obtido após um sacrificante curso de doutorado que exige a construção de uma tese científica inovadora. Sem exceção, todo profissional que aceita passivamente ser chamado de doutor sem possuir direito à designação acadêmica é um fraudador em potencial.

Em geral, médicos são pessoas provenientes da classe média, socialmente privilegiadas portanto, e que, dado o capital cultural de que dispõem, deveriam ter uma percepção mais nítida sobre o tipo de sociedade que as permitiu atingir o ápice possível do sucesso profissional ao cidadão comum. A maioria está muito distante disso, escorando as próprias conquistas na ilusão da meritocracia individual. Talvez tenham razão se meritocracia for entendida como a sorte não ser representante da quinta geração de miseráveis nascidos em favelas.
Ressaltando que todo maniqueísmo é equivocado, de modo que se deve registrar a existência de médicos verdadeiramente preocupados com a questão da saúde pública e da qualidade dos serviços médicos oferecidos à população, o que verdadeiramente subjaz nessas manifestações de parte significativa da classe médica é um substrato de odor fétido chamado "medo egoísta". Não o que seria um louvável medo profissional de que a saúde dos brasileiros esteja em situação de perigo em função de uma prática médica possivelmente realizada por profissionais ineptos. Esse é um tipo de medo que não pode ser presumido numa classe que, erradamente ou não, é apelidada pelo povo de "máfia de branco" justamente em decorrência de relatos de erros médicos absurdos ou extorsões, tais como o de pessoas que, na maca, em direção à sala de cirurgia, são obrigadas a assinar cheques em favor de médicos brasileiros, formados em nossas faculdades, para serem operadas através de convênio com o SUS procedimento que, supostamente, seria gratuito. Sem contar as notícias de médicos brasileiros "fantasmas", que, de forma corriqueira, não comparecem aos seus plantões em hospitais públicos.
Pode não ser de conhecimento geral, e as associações médicas não fazem questão nenhuma de divulgar ao público, mas existem, há anos, programas de interiorização de médicos que jamais obtiveram sucesso. Médicos brasileiros, em geral, não desejam se deslocar para o interior. Em grande parte, desejam, como é natural na maioria das pessoas, a urbanidade das grandes metrópoles, plenas de cinemas, teatros e shoppings reluzentes. O desejo é válido, o que não é válido é se opor à contratação de médicos estrangeiros para preencher um vazio decorrente justamente desse desejo. Ou seja, nem vão, nem deixam ir.
Não se duvida de que constitui, mais do que um direito, um dever dos conselhos profissionais médicos a manifestação de preocupação com as condições materiais de exercício da profissão. Todavia, o que se observa, agora, não é exatamente a demonstração desse tipo de preocupação. O que permeia a mensagem xenofóbica da classe médica, de modo oculto, dissimulado, é o temor de perda da reserva de mercado. Os médicos abominam a perda do controle total sobre a saúde da população. Querem dominar a medicina, a acupuntura, a homeopatia, a fisioterapia, a erva da vovó e a baforada no cachimbo do xamã.
Aparentemente, a única preocupação que as associações médicas não possuem é com os pobres das pequenas cidades, que nunca tiveram ou que estão há décadas sem acesso a um único médico em toda a cidade porque nenhum médico brasileiro deseja fixar residência lá.
Uma amiga, que maldosamente esclareço tratar-se de esposa de médico, lança-me a indagação: de que adianta apenas colocar um médico cubano numa pequena cidade, o que poderá ele fazer sem estrutura, sem equipamentos? A resposta é óbvia, dada sem pestanejar: muito, mas muito mais do que médico nenhum.
Médicos, munidos apenas de seu conhecimento, podem salvar vidas fazendo uma traqueostomia com uma caneta esferográfica, apenas para dar um exemplo real.
Um hospital sem médico não faz nada, mas um médico sem hospital pode realizar muita coisa.
Há outra evidente circunstância que politiza e ronda a questão que é oriunda do temor de que o programa dê certo, ou seja, o receio de que os médicos estrangeiros, principalmente os cubanos e sua expertise em medicina de família, dirigindo-se aos rincões abandonados, de fato venham a contribuir para melhorar os índices de saúde do país. Sem dúvida alguma isso seria salutar para a imagem do governo da Dilma. As demonstrações explícitas dos médicos em geral certificam que o que é bom para o governo do PT é ruim, não somente para os políticos da oposição, mas também para uma parcela bastante significativa da classe médica, cujos consultórios foram transformados em palanques políticos contra o PT.
Farsas são montadas despudoramente pela classe médica para sabotar um programa médico primacialmente direcionado para as classes mais desfavorecida, como a que foi desmascarada no site Tijolaço, cujo link é fornecido ao final.
Essa intensa movimentação política dos médicos, absolutamente inédita, pois nunca se viu grandes manifestações de médicos nas ruas "brigando" pelo interesse dos pobres, somente por aumentos salariais, desmoraliza e apequena a classe médica ao se voltar para os próprios e mesquinhos interesses corporativos, de forma autista, sem considerar as necessidades públicas e os dilemas dos necessitados.

Nenhum comentário :

Postar um comentário