sexta-feira, 3 de dezembro de 2021

O lado negro do capitalismo e do comunismo

Tempos atrás, escrevi sobre as falhas estruturais do comunismo e do capitalismo capazes de provocar a morte de um enorme número de pessoas. Para quem estiver interessado, o texto pode ser lido aqui: O capitalismo e os mortos de fome II. Nele, admiti o horror surgido das entranhas de alguns países que adotaram o comunismo, com a morte de dezenas de milhões de pessoas. Porém, como contraponto, pontifiquei sobre a hipocrisia dos simpatizantes da economia liberal, que não conseguem enxergar a responsabilidade do capitalismo por um número tão expressivo de mortos que faz com que os regimes sanguinários costumeiramente denominados de comunistas pareçam bastante aprazíveis. Diante disso, a sugestão liberal tão em voga atualmente, “não gostou vai pra Cuba”, parece possuir um sentido diferente do pretendido...

Em minha estimativa rude e absolutamente superficial, concordo, considerei, sem exceção, todas as vítimas fatais de males provocados exclusivamente pelo imperativo de lucro, ou seja, que não existiriam se não estivesse envolvido o interesse na acumulação. Por exemplo, minha contagem abrange os mortos pela fome, o que é um item óbvio, porém também os que morrem em função do tabagismo, pois entendo-o diretamente vinculado ao interesse do fabricante de cigarros. Claro que, em tese, os cigarros também poderiam existir no comunismo, mas os números certamente seriam outros, pois dificilmente ocorreria a glamourização, pela indústria cultural, de um vício incapaz de gerar, nesse sistema, uma imensa arrecadação privada (lucro) e pública (tributo). Além disso, destaquei que as guerras, praticamente todas (as exceções são poucas e não relevantes), são produto direto das crises capitalistas, um modo vil de solucioná-las, de modo que os mortos devem ser contabilizados como vítimas do liberalismo.

A partir desse entendimento, contei cerca de um bilhão e trezentos mil mortos pelo capitalismo nos últimos cem anos. Ainda que sem metodologia, é um número aterrador. Ainda que fosse metade disso, e pessoalmente não acredito, seria muitas vezes superior aos mortos pelo comunismo.

Contudo, pessoas mais sérias e respeitáveis do que eu produziram duas obras que perseguem esse mesmo objetivo: estimar as mortes causadas pelos dois sistemas econômicos: comunismo e capitalismo. Ambos projetam suas estimativas fatais para o mesmo período histórico, entre 1917 e 1989, cerca de oitenta anos, período menor do que o século considerado em meus cálculos grosseiros. As origens das mortes consideradas nas respectivas contagens também são menos abrangentes do que as que levei em conta.

O primeiro, o Livro Negro do Comunismo, de 1997, escrito por pesquisadores simpatizantes do capitalismo, portanto, anticomunistas, quantifica as mortes do comunismo provocadas por repressão política, execuções extrajudiciais, deportações, crimes de guerra e abuso de direitos humanos praticados, segundo os autores, por agentes do regime comunista. O total de pessoas mortas pelo comunismo chegaria a 94 milhões.

No ano seguinte, como resposta, publicou-se o Livro Negro do Capitalismo, cujos escritores são simpatizantes do comunismo, ou seja, anticapitalistas,. Nele, são contabilizadas as vítimas do liberalismo econômico (mercantilismo, em pequena parte, e, principalmente, capitalismo,) decorrentes de institutos como escravidão, repressão política, tortura, violência, roubo, imposição de fronteiras artificiais entre países, criação de ditaduras pró capitalistas, embargos econômicos, devastação ambiental, desastres ecológicos, fome e miséria, entre outros males liberais. Segundo a obra, seriam 106 milhões as vítimas do sistema de economia liberal.

Como não poderia deixar de ser, as duas obras são alvo de críticas em relação ao modo de contagem das vítimas e aos números finais contabilizados, embora nenhum crítico discorde de que ambos os sistemas possuem vítimas fatais em quantidades imensas.

Em outras palavras, os dois sistemas econômicos são assassinos e conduzem à suspeita de qualquer outro também o seria, desde que carregassem a mesma falha estrutural: democracia rarefeita. Aparentemente, o que provoca tantas mortes nos dois sistemas é a insuficiência democrática. No comunismo, pela supressão direta do voto para grande parte dos cargos públicos, e, no capitalismo, pela manipulação jurídica e econômico-financeira de campanhas e resultados eleitorais.

Enquanto isso, somos feitos de bobos, acusando o “outro lado” de fazer exatamente o que o “nosso lado” faz igual. E penso que é exatamente isso que os “donos” de cada sistema desejam...

O que é necessário, de verdade, é discutir a amplificação da democracia. Quanto maior o poder de decidir nossos próprios destinos, de modo representativo, mas também diretamente (como a instituição de Conselhos Populares que tanto horror causou em almas liberais tempos atrás) menores os males sociais decorrentes do sistema econômico adotado, seja capitalismo ou comunismo.

Com democracia sólida, profunda e disseminada, qualquer regime é capaz de tornar a sociedade humana mais fraterna e igualitária. Sem isso, o sistema adotado, seja qual for, corrompe-se e passa a ser colonizado por plutocratas.

Sem democracia radical, o que vinga é miséria e morte.

Os números falam por si, ou melhor, gritam...

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