É
preciso pôr fim ao pensamento rasteiro de parcela considerável da
população brasileira que sustenta que tudo no Brasil é pior do que
em outros lugares do mundo. É preciso extirpar do sentimento pátrio
esse complexo de vira-lata capaz de distorcer a visão ao ponto
extremo da autodepreciação, do autoenquadramento como cidadãos de
terceira classe do mundo. Muitas coisas no Brasil são piores, outras porém
são melhores.
O
Brasil é um país continental, imenso , e inegavelmente possui
muitos problemas, alguns de difícil solução. Todavia, são
problemas que também afetam, em maior ou menor grau, os países mais
desenvolvidos do planeta.
Por
exemplo, o sistema brasileiro de saúde pública não é excelente,
talvez não possa sequer ser considerado bom, mas existe. Nos Estados
Unidos o sistema de saúde pública é praticamente inexistente, ou
seja, o pobre não assistido por plano de saúde está virtualmente
morto se precisar de assistência médica.
Existem
no Brasil 13 milhões de analfabetos, o que significa 8,7% da
população. Na Alemanha, país altamente desenvolvido, são 7,5
milhões de analfabetos, nove porcento da população.
São
22 milhões de miseráveis brasileiro, cerca de 11% da população,
contra 46 milhões de miseráveis americanos, alcançando quase 15%
da população.
A
corrupção política é um fato na política em todos os países do
mundo e o Brasil nisso nada tem de diferente.
Enfim,
os brasileiros têm seus problemas e os estrangeiros, os deles.
A
pessoa que pisa ou incendeia a bandeira do Brasil em uma manifestação
pública, que fala mal do Brasil em qualquer ambiente público,
inclusive nas redes de relacionamento, em nada auxilia o país a
enfrentar os problemas que ela própria denuncia.
Uma
pessoa assim pode imaginar ser politicamente inteligente, mas, ao fim
e ao cabo, é apenas um ingênuo, talvez um idiota (na real acepção
da palavra). Não é capaz de distinguir entre pensamento e ação;
nação e representação; governo e Estado; político sujo e
política; desejo e realidade; interesses ocultos e revelação.
Brasileiro
que queima a bandeira e xinga o Brasil demonstra, apenas, o seu
complexo de inferioridade por ser brasileiro. Nutre um íntimo desejo
de ser europeu ou americano, amargurando-se por ter nascido no
Brasil.
Verdadeiros
patriotas jamais xingariam o próprio país, pois amam o local em que
nasceram. Ama o seu país, não em virtude de um governo, mas apesar
dele.
Quem
deseja o bem da nação e não concorda com o governo, xinga o
governo, não o país, nem rasga a bandeira. Ao entender que o
governo age em desacordo com os interesses da república, maneja o
instrumento democrático, o voto, para mudar os mandatários.
Um
patriota, mesmo no extremo de uma revolução, busca mudar o governo
porque ama o seu país. O real patriota não compara, em demérito,
seu país com nenhum outro. Os que se sentem inferiores, com certeza.
Os ingênuos. talvez.
Para
os que nutrem complexo de inferioridade nacional, a paz jamais virá,
nem que fossem europeus, pois a inferioridade neles reside, não no
país.
Quanto aos ingênuos, para eles a manchete de jornal é a
representação da verdade; a sentença judicial, a materialização
da justiça; e o aprendizado que vem do berço é, sem tirar, nem
pôr, a expressão da verdade absoluta.
Um
pensador pontificou que de nada adianta o sábio tentar tirar alguém
da escuridão, se esse alguém não é um iniciado na luz. O não
iniciado jamais acreditará que exista luz, a escuridão sempre foi
sua realidade cotidiana.
Para
o ingênuo, a palavra do sábio que está à sua esquerda é apenas
mais uma opinião sem valor, que em nada difere daquela proferida
pelo outro ingênuo que está à direita.
Um
outro pensador, com maior profundidade, afirmou que o maior truque do
demônio consiste em fazer o ingênuo acreditar em sua inexistência.
Efetivamente, mesmo após quinhentos anos de números ruins de
governos escolhidos por doutores, o ingênuo não consegue perceber
doze anos de números bons no governo de eleitos pelos
semi-analfabetos. Para os ingênuos, os números sempre estarão
errados, pois estão em desacordo com as manchetes. Para eles, a
manchete é o caminho, a verdade e a luz.
É
comparável a uma religião, pois não se vê, mas se acredita
firmemente. Eis o mistério da fé.
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