O
filósofo da USP Paulo Eduardo Arantes, atualmente aposentado,
publicou um artigo na Folha de São Paulo, em 27 de maio de 2001,
intitulado “Extinção” (1), por ocasião do apagão elétrico
ocorrido durante o governo FHC.
Em
seu artigo, o filósofo recordava que Adorno e Horkheimer, meio
século antes, haviam advertido que “uma das lições que a era
Hitler nos ensinou é a de como é estúpido ser inteligente”,
pois, segundo esses pensadores, fora a mais alta intelectualidade
europeia que teria pavimentado a estrada em direção à ascensão do
nazismo a partir de argumentos lógicos sobre a inviabilidade do
sucesso de tamanha aberração. Deu no que deu.
Paulo
Eduardo deixava claro que havia um evidente paralelo, na época de
seu artigo, entre os “inteligentes” europeus do turbulento
período pré-nazista e os “inteligentes” paulistas:
“Falo
é claro dos inteligentes de São Paulo e de suas ramificações
nacionais e internacionais de alto nível. Digamos que a estupidez da
inteligência foi se tornando nos últimos tempos uma original
contradição paulista.”
E,
nesse ponto, Paulo Eduardo se permitia uma concessão aos hierarcas
do império nazista, pois , dada sua condição de bárbaros, eram
“naturalmente inimigos mortais da vida do espírito”. Porém,
esse mesmo perdão não é concedido àqueles que ele entende possuir
um “espírito anti-humano” caracterizado por sua “marca de
origem: a superioridade bem-informada”.
Essa
“superioridade bem-informada”, a meu ver, deve ser entendida como
arrogância e vaidade intelectual, que são óbices ao reconhecimento
do erro, ao pedido de perdão e ao estabelecimento do diálogo.
Referia-se
Paulo Eduardo à “inteligência” paulista integrante da elite do
PSDB, que deveria, naquela época, em 2001, apagão elétrico nas
casas, produzir “um solene pedido formal de desculpa aos
brasileiros e brasileiras que há sete anos aturam entre tantas
outras delicadezas de atenção social o estribilho da referida
pedantocleptocracia”.
Paulo
Eduardo, em seu artigo, clamava pelo não esquecimento do apocalipse
nazista e da lição que dele extraiu Hannah Arendt, ao encontrar “a
descoberta da mais aterradora crueldade social germinando no processo
aparentemente banal de corrupção da inteligência”.
A
corrupção da inteligência, pois, tanto em Paulo Eduardo, como em
Hanna Arendt, é capaz de produzir conflitos sociais potencialmente
perigosos para a sociedade humana, pois, a partir dela, iniciado o
caminho para a destruição, não há volta ou retorno à sensatez,
já que um outro efeito seu é a cessação do diálogo provocado
pela prepotência e arrogância intelectual de quem se vê como
infalível.
Hoje,
esse mesmo filósofo, em entrevista também à Folha de São Paulo,
enfatiza que foram as manifestações de junho de 2013 que fizeram
surgir no Brasil uma nova direita, que ele interpreta como um dos dos
fenômenos mais importantes do Brasil contemporâneo. Ele traça um
paralelo entre o fenômeno brasileiro e o que ocorreu nos Estados
Unidos. Segundo ele:
"A
direita norte-americana não está mais interessada em constituir
maiorias de governo. Está interessada em impedir que aconteçam
governos. Não quer constituir polticas no Legislativo e ignora o
voto do eleitor médio. Ela não precisa de voto porque está sendo
financiada diretamente pelas grandes corporações".
No
pensamento de Paulo Eduardo Arantes, fora o período eleitoral, que é
um teatro em que o engalfinhamento ocorre por sobrevivência, a
esquerda não possui esse mesmo comportamento observado na nova
direita. Isso ocorre por que a esquerda, hoje, assumiu o papel de
governante, o que a obriga a “constituir maiorias, transigir,
negociar, transformar tudo em um mingau".
Por
isso, fechadas as cortinas eleitorrais, a esquerda só quer paz e
amor, trocam-se beijos e ministros e se tenta governar.
Ocorre,
porém, que mesmo após as eleições, só um lado está interessadoa
em governar. Do outro está a nova direita realizando o que
sociólogos americanos classificam de "polarização
assimétrica", ou seja, uma oposição sem freios de um lado e o
outro tentando contemporizar.
Paulo
Eduardo, assim, nos fala sobre dois momentos distintos da corrupção
da inteligência brasileira, o seu berço paulista, e ainda sua maior
expressão política, e a sua disseminação na política nacional
através do que ele denomina de nova direita.
A
intelectualidade corrompida grita e seus gritos ecoam pelos ouvidos
da nação.
Desde
a campanha eleitoral de 2010 que o país assiste à elevação do tom
do radicalismo, Agora em 2014 chegou ao confronto físico em várias
oportunidades, além de provocar um sem-número de separações
sociais entre amigos e parentes.
A
corrupção da inteligência avança pelo Brasil e produz seus
estragos. Até onde irá depende, ou de um surpreendente retrocesso
da própria intelectualidade corrompida, ou da sanidade popular em
rechaçar a propaganda enganosa e amplamente disseminada dessa
intelectualidade.
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